5 questões de Ginecologia e Obstetrícia comentadas

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Fala moçada, tudo certo? Esperamos que sim, pois hoje vamos trazer mais um desafio! Alguns de vocês já devem conhecer nossa série de textos em que trazemos 5 questões de diferentes áreas médicas com comentários dos nossos professores para você testar seus conhecimentos e ainda receber aquela assistência para qualquer dúvida que surgir, lembrando que o estudo por questões pode ser muito eficiente pra aumentar seu rendimento nas provas de residência médica! Hoje é a vez de estudar com 5 questões de Ginecologia e Obstetrícia comentadas!

Bora lá? Boa sorte!

Questão 1

SCMSP 2016 – Tercigesta, 34 anos, com dois abortamentos anteriores, procurou atendimento médico com 8 semanas de gravidez e seu obstetra solicitou pesquisa de trombofilias, mesmo na ausência de antecedentes familiares. Os resultados revelaram homozigose para variante termolábil do gene da metileno tetrahidrofolato redutase (MTHFR C677T), heterozigose para fator V de Leiden e homocisteinemia normal. Sobre esse caso é correto afirmar:

A. Alterações do Fator V são as mais trombogênicas, de modo que o risco de tromboembolismo na gravidez associado à sua heterozigose é maior que aquele associado à homozigose do gene da protrombina G20210A.

B. A homozigose para MTHFR C677T está presente em cerca de 15% da população europeia e, se acompanhada de homocisteinemia normal, não se associa a risco estatisticamente maior de tromboembolismo na gravidez.

C. Em se tratando de abortamento de repetição, deve-se iniciar imediatamente heparina de baixo peso molecular e solicitar-se anticorpo anticardiolipina e anticoagulante lúpico.

D. Devido à homozigose para MTHFR C677T, deve-se iniciar imediatamente a administração de heparina de baixo peso molecular, na dose de 20 a 40mg/dia, e mantê-la até 6 semanas pós-parto.

E. Como há necessidade de suspensão de anticoagulante antes do parto por um período pré-determinado, neste caso está indicada a resolução da gravidez por cesariana.

Comentário

Vamos lá, pessoal. Sem desespero.

Questão super específica. Vou fazer uma minirrevisão das coisas mais importantes que você precisa saber desse tema, ok ? 

Sempre que estamos diante de um quadro de abortamento de repetição (2 ou mais perdas) devemos investigar TROMBOFILIAS ADQUIRIDAS, a famosa SAAF. Nesta investigação devemos solicitar: anticoagulante lúpico, anticardiolipina e anti-B2-glicoproteína I. 

Ainda é muito discutível na literatura quando devemos solicitar triagem para as TROMBOFILIAS HEREDITÁRIAS, que são basicamente: antitrombina III, proteína S, proteína C e fator V de Leiden. No momento, a indicação é investigar em caso de história pessoal de TEV ou história de trombofilia em familiar de 1º grau. Em termos de potencial trombogênico temos que a antitrombina III > Proteína C > Proteína S > Fator V de Leiden. 

Já em relação a MTHFR, ela é uma enzima que atua no metabolismo da homocisteína. Quando mutada pode levar a um quadro de homocisteinemia. Essa homocisteinemia leva a um maior estresse oxidativo, lesão endotelial e trombose. 

Bom, com essa bagagem teórica vamos às questões! 

A. Incorreta. A mutação do fator V é o menos trombogênico dentre as trombofilias adquiridas. 

B. Correta. A mutação da metileno tetrahidrofolato redutase por si só não aumenta o risco de trombose, já que é o acúmulo de homocisteína que leva a um estresse oxidativo e lesão endotelial. Ou seja, sempre que fizer a pesquisa da mutação lembre-se de dosar a homocisteína, caso contrário você não terá nenhuma aplicação clínica do exame. 

C. Incorreta. Nem todas as pacientes com diagnóstico de abortamento de repetição vão ter indicação de anticoagulação durante a gravidez.

D. Incorreta. Lembra que o risco de trombose só aumenta se tivermos acúmulo de homocisteína? Além disso, o uso de anticoagulação nas trombofilias adquiridas é bastante discutível. 

E. Incorreta. O anticoagulante deve ser suspenso 24 horas antes do parto e não há obrigatoriedade de resolução por via alta. A indicação da via de parto é obstétrica! 

Visão do aprovado: a banca está de sacanagem né? Tema ultra específico pro acesso direto. Além de várias polêmicas e discussões na literatura sobre ele, mas valeu a pena pra você já estudar tudo que vai precisar saber sobre esse assunto. Bora pra próxima. 

Nível de dificuldade: difícil.

Gabarito: alternativa B.

Questão 2

SCMSP 2016 – Primigesta, 26 semanas de gravidez, sem antecedentes mórbidos, há uma semana iniciou aumento dos níveis pressóricos. Foram solicitados exames complementares que revelaram: Hemoglobina 11,5 g/dL, Plaquetas 145000/mm3, TGO 45 U/L, Bilirrubinas Totais 0,6 g/dL, Atividade de Protrombina 98%, Creatinina 0,7 mg/dL, Proteinúria de 500mg em 24h. Sobre a doença em questão é correto afirmar:

A. Seu aparecimento antes de 34 semanas está relacionado a maiores valores de relação sFlt-1/PIGF.

B. Pode produzir centralização hemodinâmica fetal, que será diagnosticada quando a resistência da artéria cerebral média ultrapassar a da umbilical.

C. A resistência das artérias uterinas terá valor no cálculo de seu risco apenas após 26 semanas.

D. Como na doença em questão os níveis pressóricos se elevam a partir de 20 semanas, na determinação do risco de seu desenvolvimento a pressão arterial média, no primeiro trimestre, não deve ser levada em consideração.

E. O único marcador bioquímico confiável na sua predição, com especificidade de 89% para casos graves, é a PP 13.

Comentário

Calma, moçada. Estamos diante de um caso de pré-eclâmpsia, e isso fica bem claro pela descrição do caso, né? Após a 20ª semana + níveis pressóricos elevados + proteinúria > 300 mg. Beleza! Vamos por exclusão?

A. Correta. De acordo com Santos AV e cols., em Pre-eclampsia: Risk factors and outcomes – A two-year stud, Pregnancy Hypertens 2012;2:294, a relação sFlT-1 (tirosina quinase solúvel)/PlGF (fator de crescimento placentários) se encontrará mais elevada quanto mais precoce o aparecimento da PE.

B. Incorreta. A centralização fetal é diagnosticada pela alteração na relação cerebroplacentária (RCP), calculada pela relação entre resistência na cerebral média e a umbilical; RCP abaixo do p 2,5 define centralização e tem valor a qualquer momento da gestação. 

C. Incorreta. A artéria uterina está relacionada com a circulação materna, portanto alterações precoces estão relacionadas a aumento de risco futuro de insuficiência placentária.

D. Incorreta. Esta é tosca, qualquer aumento pressórico na gestação deve ser considerado, tendo em vista os diagnósticos diferenciais da PE/DHEG/Toxemia gravíca/HAS sobreposta.

E. Incorreta. Não vacila, mané! A PP-13 (proteína placentária-13) é um marcador de invasão placentária, cuja elevação abrupta está associada a PE e Sd HELLP. Porém, sua sensibilidade é considerável apenas após a 2ª onda de invasão trofoblástica, ou seja, após a 20ª semana, e quando associada a dosagem da PAPP-A (proteína plasmática A), tem sua sensibilidade aumentada. Show de bola!

Visão do aprovado: questão extremamente difícil, que muitos acertaram porque excluíram as outras 4 opções. Agora se você não consegue decorar essas mil informações de dopplerfluxometria fetal, vamos tentar entender. A artéria uterina vê a circulação materna, portanto só podemos relacionar ela a doenças relacionadas à mãe. Já a artéria umbilical vê a circulação placentária, portanto relacionamos ela à insuficiência placentária quando temos um fluxo baixo e, portanto, uma alta resistência. Já a artéria cerebral média (ACM) vê a circulação fetal — quando o feto tem pouco sangue, ele precisa privilegiar órgãos importantes, e um deles é o cérebro, portanto ele diminui a resistência da ACM aumentando o aporte sanguíneo local.

Nível de dificuldade: difícil.

Gabarito: alternativa A.

Questão 3

FAMERP 2019 – Paciente de 45 anos com ultrassom mostrando cisto com conteúdo espesso no ovário esquerdo. Foi submetida à Ooforectomia e o exame de congelação diagnosticou um Cistoadenoma Mucinoso. Houve ruptura do mesmo no ato operatório. De acordo com este enunciado, qual das abaixo está correta?

A. A Ooforoplastia teria sido a melhor opção cirúrgica.

B. A paciente corre o risco de desenvolver um pseudomixoma.

C. O cisto era benigno e a paciente está tratada.

D. Por se tratar de um cisto maligno deverá ser submetida à cirurgia radical (Pan Histerectomia).

Comentário

O cistoadenoma mucinoso é um cisto ovariano benigno, derivado da das células epiteliais-estromais superficiais. Apresenta parede espessa e contém muco, podendo ser uni ou multiloculada.

Ao USG sua forma é ovoide ou arredondada. A cápsula é lisa, brilhante e cinza-clara. Pode apresentar septos que o dividem, formando vários lóculos preenchidos por conteúdo líquido claro e viscoso. Raramente apresenta papilas. É bilateral em 10% dos casos.

A conduta deve ser a retirada do ovário, uma vez que a regressão espontânea não ocorre e o cisto pode tornar-se grande. Nesse caso, a abordagem cirúrgica deve ser muito cuidadosa, evitando o rompimento da cápsula e o extravasamento para o abdome, o que poderia causar pseudomixoma peritoneal. Com essas informações, vamos checar as alternativas:

A. Incorreta. A primeira opção é a ooforectomia. A ooforoplastia é escolha de exceção quando há intenção de preservar a fertilidade.

B. Correto. Como vimos, o extravasamento do muco para a cavidade peritoneal pode gerar pseudomixoma.

C. Incorreta. Apesar do cisto ser sim benigno, a paciente não está tratada devido ao rompimento da cápsula no intraoperatório. Ela deve ser acompanhada pelo risco de recidiva.

D. Incorreta. Não é um tumor maligno, mas sim benigno.

Visão do aprovado: faça esse link mental entre cistoadenoma mucinoso e pseudomixoma peritoneal. Eu sei que tumores ovarianos é um assunto espinhoso, mas é fundamental que você treine saiba pelo menos o básico sobre o assunto, beleza?

Nível de dificuldade: difícil.

Gabarito: alternativa B.

Questão 4

USP-RP 2021 – Paciente com 44 anos, G3P3AO (3PN), refere ciclos menstruais regulares, procura atendimento ginecológico referindo que há 4 meses iniciou com polaciúria, noctúria, sensação de esvaziamento vesical incompleto, além de urgência miccional associada. Ao exame físico foi observado o descrito abaixo:

Hg: HIATO GENITAL: Cp: CORPO PERINEAL; Cvt: COMPRIMENTO DA VAGINA TOTAL; POP-Q: PELVIC CGRGAN PROLAPSE QUANTIFICATION SYSTEM.

Após descartar infecção urinária qual a melhor conduta para esta paciente neste momento?

AaBaC
-3-2-6
HgCpCvt
438
ApBpD
-3-1-8

A. Colporrafia anterior e posterior e imipramina 25 mg oral por dia.

B. Cirurgia de sling e solifenacina 5 mg oral por dia.

C. Eletroestimulação transcutânea e oxibutinina 5 mg oral por dia.

D. Treinamento vesical e perineal com cones vaginais.

Comentário

Paciente apresenta quadro de urgência e noctúria, além de aumento da frequência. É um quadro clássico de síndrome da bexiga hiperativa (SBH). Refere ainda sensação de esvaziamento incompleto. 

No POP-Q percebemos que há prolapso mínimo de compartimentos anterior e posterior, e, dada a ausência de queixas de prolapso, não demanda tratamento específico. Bora ver nossas opções:

A. Incorreta. A colporrafia anterior e posterior é reservada para pacientes com prolapsos estadios 3 e 4 dos componentes anterior e posterior, sem prolapso do componente apical. Não é o caso da nossa paciente. 

B. Incorreta. A cirurgia de sling é indicada para pacientes com incontinência urinária de esforço, não SBH. 

C. Correta. Eletroestimulação transcutânea e oxibutinina são opções terapêuticas para o tratamento da SBH. Lembrem-se que os primeiros passos são modificações do estilo de vida e fisioterapia do assoalho pélvico, mas não há alternativas que contemplem esses fatores. 

D. Incorreta. O treinamento vesical é sim uma possibilidade terapêutica, entretanto o treinamento perineal com cones vaginais está indicado para tratamento de frouxidão vaginal, não possuindo papel significativo no tratamento da SBH. 

Visão do aprovado: aqui o pulo do gato é fazer o diagnóstico sindrômico de SBH. A partir daí vamos excluindo alternativas que claramente vão contra o tratamento padrão. 

Nível de dificuldade: difícil.

Gabarito: alternativa C.

Questão 5

EINSTEIN 2021 – Em relação às vulvovaginites:

A. A vaginite aeróbica é diagnosticada pela coloração de Gram e dosagem de interleucina B diminuída.

B. A vaginite atrófica ocorre com frequência em mulheres que fazem antibioticoprofilaxia para infecção urinária.

C. O tratamento da vaginose bacteriana é realizado com ampicilina via oral e corticoide via vaginal por 7 dias.

D. A vaginite atrófica acomete puérperas e usuárias de contraceptivos hormonais e é tratada com progesterona natural por pelo menos 30 dias.

E. Os agentes etiológicos mais comuns da vaginite aeróbica são Escherichia coli, Staphilococcus aureus, Streptococcus agalactiae e Enterococcus faecalis.

Comentário

Einstein gosta de cobrar umas coisas que pouco são comentadas na ginecologia, como a vaginite aeróbia. Trata-se de uma alteração do meio vaginal, com flora contendo bactérias entéricas aeróbicas, inflamação e deficiência na maturação epitelial. 

É diagnóstico diferencial das leucorreias purulentas, com odor desagradavel. No entanto, o whiff teste é negativo. A irritação é variável, com elevação do pH vaginal. Estão presentes no esfregaço células epiteliais imaturas, presença de leucócitos e predomínio de algumas bactérias: Streptococcus sp., Staphylococcus aureus e Escherichia coli; tais microrganismos passariam da condição de simples comensais para agressores. 

A. Incorreta. O diagnóstico da vaginite atrófica não leva em conta a dosagem da interleucina B.

B. Incorreta. A vaginite atrófica está relacionada ao hipoestrogenismo, e tem como diagnóstico diferencial infecção do trato urinário. Não há evidências de que a antibioticoprofilaxia esteja associada a vaginite atrófica. 

C. Incorreta. O tratamento da VB, como sabemos, é com metronidazol (via oral ou tópico). Não usamos corticoide via vaginal para esta patologia. 

D. Incorreta. O tratamento da vaginite atrófica é realizado com estrogênio tópico, via vaginal, não progesterona. Cuidado com os fatores de risco: o principal é a síndrome genito-urinária do climatério. 

E. Correta. Esses são os agentes mais comuns.

Visão do aprovado: questão bastante difícil, abordando vaginite aeróbica. Existem autores que consideram-na fazendo parte do espectro da vaginite inflamatória descamativa. Não temos uma normativa do tratamento, podendo-se usar corticóide quando predomina a inflamação, estriol quando predomina a atrofia ou antibiótico quando há excesso de bactérias.

Nível de dificuldade: difícil.

Gabarito: alternativa E.

E aí, o que achou das questões de Ginecologia e Obstetrícia comentadas?

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É isso galera! Até a próxima!

JoãoVitor

João Vitor

Capixaba, nascido em 90. Graduado pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) e com formação em Clínica Médica pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP (HC-FMUSP) e Administração em Saúde pelo Hospital Israelita Albert Einstein (HIAE). Apaixonado por aprender e ensinar. Siga no Instagram: @joaovitorsfernando