Fala moçada, tudo certo? Se ajeita aí que tá na hora de resolver algumas questões! Alguns de vocês já devem conhecer nossa série de textos em que trazemos 5 questões de diferentes áreas médicas com comentários dos nossos professores para você testar seus conhecimentos e ainda receber aquela assistência para qualquer dúvida que surgir. E hoje é a vez de trazer 5 questões de Hepatologia comentadas!
Preparado? Então bora lá!
UFPR 2016 – Em relação às complicações agudas da hepatopatia crônica, assinale a alternativa correta.
A. A peritonite bacteriana espontânea ocorre, com frequência, em cirróticos sem ascite, principalmente quando a etiologia for alcoólica.
B. A vasodilatação venosa proposta para explicar a retenção de sal e água na cirrose é a hipótese mais aceita na etiopatogenia da síndrome hepatorrenal.
C. O desvio de sangue porto-sistêmico, impedindo a passagem de várias substâncias nitrogenadas procedentes do intestino, constitui um dos fatores preponderantes na etiologia da encefalopatia hepática.
D. Hemorragia digestiva alta varicosa pode ocorrer em qualquer segmento do tubo digestivo, predominando no fundo gástrico.
E. Dentro os fatores predisponentes mais importantes da encefalopatia hepática destacam-se a hemorragia digestiva alta, peritonite bacteriana, constipação e acidose.
Moçada, nessa questão precisamos dominar a fisiopatologia e definição das principais complicações da Hepatopatia Crônica, senão podemos acabar comendo bola.
A. Incorreta. A principal definição de Peritonite Bacteriana Espontânea (PBE) é a infecção do Líquido Ascítico – especialmente em pacientes cirróticos nos quais a prevalência é muito maior. Como é possível afirmar que a PBE ocorre em cirróticos sem ascite? Não dá.
B. Incorreta. A afirmação associa a causa da Síndrome Hepatorrenal com vasodilatação venosa. Na verdade, o fator mais importante associado é uma vasodilatação arterial — especialmente mesentérica e associada à liberação de citocinas, desencadeando a ativação do Sistema Renina-Angiotensina-Aldosterona e, consequentemente, uma vasoconstrição arterial renal com retenção de Sódio e Água.
C. Correta. Lembrem que quando ocorre uma destruição progressiva dos hepatócitos acaba ocorrendo um aumento da pressão porta — possibilitando a formação de comunicações diretas entre o sistema porta e a circulação sistêmica, o que facilita a passagem de toxinas que vem do intestino em direção ao Sistema Nervoso Central, gerando a Encefalopatia Hepática. Vale lembrar que pacientes submetidos à TIPS — um shunt da veia porta para a veia cava — tendem ao surgimento ou piora da encefalopatia hepática, por desviar “sangue sujo” da veia porta diretamente para a veia cava inferior.
D. Incorreta. O erro está ao afirmar que o predomínio é no fundo gástrico, já que a principal localização da HDA varicosa é no esôfago.
E. Incorreta. Faz uma sopa de letrinhas e acaba misturando vários conceitos.
Visão do aprovado: Destruição Hepatocelular -> Hipertensão Porta -> Shunts Portossistêmicos -> Toxinas Intestinais (Amônia!) -> Encefalopatia Hepática.
A HDA e os Shunts são consequência da Hipertensão Porta, mas não são predisponentes entre si. Além disso, a questão deixa de citar a Hipertensão Porta e as comunicações que são os fatores mais importantes!
Antes de partirmos para a questão 2, quero aproveitar para te contar que você pode saber mais sobre como lidar com a cirrose e suas complicações, de forma prática, no nosso e-book Cirrose hepática e suas complicações, que traz as principais informações que você precisa saber na hora de diagnosticar e manejar um paciente hepatopata. Clique AQUI para fazer o download gratuito!
Unicamp 2021 – Mulher, 63a, com diagnóstico de cirrose alcoólica, está internada por descompesação clínica há 3 dias, com piora da ascite, oligúria e início de encefalopatia hepática. Em uso diário de espironolactona 200mg, furosemida 40mg e complexo vitamínico. Creatinina 1,7 mg/dL; (0,8 mg/dL na entrada); Líquido ascítico: hemácias= 1.300/mm³, leucócitos= 420/mm³ (62% de linfócitos, 31% neutrófilos e 7% de monócitos); proteína= 1,4 g/dL, albumina= 0,7 g/dL.
O diagnóstico e a conduta são:
A. Peritonite bacteriana espontânea com disfunção renal; prescrever ceftriaxona e albumina.
B. Lesão renal aguda estágio 1; reduzir diuréticos e prescrever ceftriaxona empírico.
C. Lesão renal aguda estágio 2; suspender diuréticos e prescrever albumina humana.
D. Síndrome hepatorrenal; prescrever albumina humana e terlipressina.
Observe o quadro clínico: Temos uma mulher, 63a, com diagnóstico de cirrose alcoólica, que está internada por descompensação clínica há 3 dias, com piora da ascite, oligúria e início de encefalopatia hepática. Em uso diário de espironolactona 200mg, furosemida 40mg e complexo vitamínico. Com creatinina elevada em 1,7 mg/dL; (0,8 mg/dL na entrada); Líquido ascítico: hemácias= 1.300/mm3 , leucócitos= 420/mm3 (62% de linfócitos, 31% neutrófilos que equivalem a 130 neutrófilos e 7% de monócitos); proteína = 1,4 g/dL, albumina = 0,7 g/dL.
De uma maneira geral podemos falar que essa questão aborda um paciente cirrótico descompensado. Temos nessa paciente três disfunções: piora da ascite, disfunção renal e encefalopatia hepática.
A questão logo pergunta o diagnóstico e, pelas alternativas, vemos que eles focam na etiologia de duas das disfunções apresentadas: ascite e disfunção renal. O que pode nos confundir e levar a marcar logo a letra D é pensar que cirróticos com disfunção renal sempre devem ter síndrome hepatorrenal como etiologia. Porém precisamos lembrar que este é um diagnóstico de exclusão, sendo os critérios diagnósticos:
A paciente estava em uso de diuréticos, com espironolactona em dose alta, e ainda não recebeu teste de expansão volêmica com albumina. Temos, então, 2 fatores confundidores que impossibilitam o diagnóstico de SHR. Agora vamos analisar as alternativas:
A. Incorreta. PBE é definida como PMN>250. Nosso paciente possui <250 neutrófilos (130, e nem fizemos a correção pelo número de hemácias -> 1300/250 = 5,2; logo temos aproximadamente 125 neutrófilos), além de que não possui dor abdominal ou febre. Clinica e laboratorialmente incompatível.
B. Incorreta. LRA estagio 1 é definida como aumento de creatinina de 1,5 a 1,9x o basal. No caso, paciente já se apresenta com valor >2x na entrada, o que a classifica como KDIGO II. A redução dos diuréticos é pertinente. Mas, a conduta também não está correta, pois não temos justificativa para prescrever o ATB.
C. Correta. O que sabemos com certeza? Paciente tem aumento entre 2-3x Cr entrada, logo tem LRA KDIGO II. Vamos então suspender os diuréticos e fazer albumina como principal expansor volêmico do paciente cirrótico. Concomitantemente, vamos estar avaliando a responsividade a administração de albumina, caso não ocorra, vamos considerar a presença de critérios para SHR.
D. Incorreta. Como dito anteriormente, sem a expansão volêmica com albumina, ainda é muito cedo para fechar critérios para a síndrome e iniciar tratamento com vasoconstritores esplâncnicos. Grande pegadinha da questão.
Visão do aprovado: questão difícil que exige calma na hora de responder. Vamos sempre com as informações que temos certeza, sem imaginar a evolução do paciente e o que acreditamos ser o mais provável. Vale relembrar os critérios para SHR (e o principal é não apresentar resposta à expansão volêmica com albumina) e o estadiamento da KDIGO, o mais cobrado nas provas para IRA.
SMS 2020 – Mulher, 36 anos, procedente de Belém-PA, admitida na UTI por quadro de hepatite fulminante pelo vírus da hepatite B, com indicação de transplante hepático. Tem antecedente de hepatite C tratada com resposta virológica sustentada (cura). Assinale a alternativa que melhor reflete seu estado sorológico atual.
A. HBsAg (+), anti-HBc total (+), anti-HBc IgM (+), anti-HBs (-), Anti-HCV (+)
B. HBsAg (+), anti-HBc total (+), anti-HBc IgM (-), anti-HBs (-), Anti-HCV (-)
C. HBsAg (+), anti-HBc total (+), anti-HBc IgM (+), anti-HBs (-), Anti-HCV (-)
D. HBsAg (-), anti-HBc total (+), anti-HBc IgM (-), anti-HBs (+), Anti-HCV (+)
E. HBsAg (+), anti-HBc total (+), anti-HBc IgM (-), anti-HBs (+), Anti-HCV (+)
Pessoal, paciente jovem de 36 anos, evoluindo com hepatite fulminante por Vírus B. A questão não nos deu um quadro clínico, mas vamos aproveitar para discutir um pouco sobre hepatite fulminante.
A maior parte da literatura define esta entidade como uma insuficiência hepática que evolui em menos de 26 semanas (mais ou menos 6 meses) a partir da lesão inicial. Então por exemplo, no caso de Hepatite Fulminante por Hepatite B, precisamos de evidência de que o paciente evoluiu com insuficiência hepática ainda na fase aguda da infecção. Essa insuficiência hepática é caracterizada — classicamente — por Encefalopatia Hepática e Coagulopatia (INR ≥1.5)
Como eu vou saber que essa infecção por Hepatite B é aguda? Para isso, vamos relembrar alguns conceitos sobre marcadores sorológicos das hepatites virais.
Se o paciente já teve contato com o vírus C, independentemente de estar curado ou não, ele terá a marca sorológica do Anti-HCV! No caso da Hepatite B é um pouco mais complicado, mas com calma a gente desenrola.
O que a presença do Anti-HBs diz pra gente? Que o paciente é imune ao Vírus B! Essa imunidade pode ser adquirida através de vacinação ou por infecção pelo HBV que foi curada. O paciente com esse marcador não tem infecção atual pelo vírus!
O HBsAg é um marcador de infecção ATUAL pelo HBV!
Se o paciente tem o vírus no corpo, ele vai ter este antígeno no sangue.
É no Anti-HBc que a gente se perde às vezes, mas vamos lá. Anti-HBc é o anticorpo que adquirimos contra o vírus selvagem, ou seja, a vacina não gera este anticorpo. É um marcador de infecção — antiga e recente.
Então como saberemos a temporalidade dessa infecção?
IgM é um anticorpo de fase aguda, sendo um marcador de infecção recente.
O IgG, por sua vez, aparece semanas após o IgM, sendo considerado um marcador de infecção tardia.
O AntiHbC total se refere às duas porções (IgM e IgG), sem especificar entre elas.
Pronto, depois dessa “breve” introdução, vamos agora construir nossa resposta.
Se a hepatite é fulminante, a infecção é recente (aguda) ou antiga (crônica)?
Aguda! Então nosso marcador será o Anti-HBc IgM!. Como o Anti-HBc IgM é positivo, o total também vai ser!
Além disso, o paciente está infectado pelo vírus, logo vai apresentar o marcador de infecção (HBsAg +) e não terá o marcador de cura (Anti-HBs)
E do vírus C? Como ele já teve contato, será Anti-HCV +!
A. Correta. Conforme discussão acima!
B. Incorreta. O Anti-HBc IgM deve ser positivo, indicando infecção aguda. Além disso, o Anti-HCV também deve estar presente, já que a paciente foi exposta previamente ao HCV.
C. Incorreta. O Anti-HCV deve ser positivo, pelo histórico de exposição prévia ao HCV.
D. Incorreta. Esse é o padrão esperado no paciente com exposição ao HBV e cura, a posteriori. HBsAg (-), anti-HBc total (+), anti-HBc IgM (-) — e portanto IgG positivo — e anti-HbS (+)
E. Incorreta. O anti-HBc IgM deveria ser positivo e o anti-HBs negativo.
Visão do aprovado: nessas questões que envolvem combinações de itens, sempre tentem procurar aqueles que vocês têm mais certeza primeiro. No caso desta questão, se eu tenho certeza que o Anti-HBs é negativo, eu já excluo as alternativas D e E.
SMS 2020 – Mulher, 20 anos, admitida em uma Unidade de Urgência e Emergência após uso de 4 cartelas de paracetamol (aproximadamente 12 gramas) como tentativa de suicídio. Encontra-se desacordada e ictérica. Pelos relatos dos familiares, o episódio ocorreu há cerca de 3 dias. Colhida gasometria arterial que revelou pH = 7,21. Assinale a alternativa que indica corretamente qual a conduta mais adequada para essa paciente.
A. N-acetilcisteína e penicilina G endovenosas.
B. Listagem para transplante hepático e prednisona.
C. Lavagem gástrica e administração de carvão ativado.
D. Penicilina G endovenosa e listagem para transplante hepático.
E. N-aceticisteína endovenosa e listagem para transplante hepático.
Bom pessoal, temos uma paciente jovem com sinais de lesão hepática grave após tentativa de suicídio por Paracetamol.
O paracetamol, em muitos países, é a principal causa de Hepatite Fulminante! As doses letais são realmente bem altas, acima de 10 a 15 gramas – por isso é muito difícil observar intoxicação acidental, habitualmente isso acontece em tentativas de autoextermínio, como na questão.
O examinador cobra aqui a indicação de transplante hepático nos casos de hepatite fulminante.
Há algumas décadas, um grupo de pesquisadores listou alguns marcadores de pior prognóstico na hepatite fulminante. Mais tarde, esses marcadores se mostraram úteis para definir quem seria candidato ao transplante hepático.
A. Incorreta. A N-acetilcisteína é o antídoto para a intoxicação por paracetamol e pode ser utilizada nesses casos, mas não há benefício de antibioticoterapia, já que não existe evidência de infecção bacteriana. Ao longo da internação hospitalar estes pacientes podem infectar e precisar de antibiótico, mas não é o caso no momento.
B. Incorreta. Transplante hepático está indicado! Observe que o pH é < 7.3, enquadrando a paciente nos critérios do King’s College. A prednisona não possui nenhum papel na situação descrita.
C. Incorreta. A lavagem gástrica é uma opção para os pacientes que chegam rápido ao pronto socorro, nas primeiras duas horas após a ingestão da substância. Além disso, a consciência deve estar preservada. Nossa paciente está no 3° dia de evolução, toda medicação administrada via oral já foi absorvida e – portanto – esse procedimento não está indicado. A mesma lógica se aplica ao carvão ativado. Realizar essas medidas neste momento só aumentará o risco de broncoaspiração, sem trazer qualquer espécie de benefício.
D. Incorreta. Novamente: não há indicação de antibiótico!
E. Correta. Podemos tentar a N-acetilcisteína, mas sempre tendo em mente que a paciente já tem indicação de transplante hepático!
Visão do aprovado: dá pra acertarmos essa questão sem saber de cabeça os critérios do King’s College? Dá sim! Primeiro temos que saber que não há sentido indicar lavagem ou carvão ativado de forma tão tardia. Também temos que saber que não há espaço para antibiótico ou corticoide nessa situação. A questão poderia ter sido mais cruel se exigisse do candidato o conhecimento das indicações específicas, mas aí já é demais, concordam?
A outra dica no assunto de intoxicações é tentar memorizar os tóxicos que tem antídoto. Para o parACETamol é fácil: N-ACETilcisteína!
Bom pessoal, temos uma paciente jovem com sinais de lesão hepática grave após tentativa de suicídio por Paracetamol.
O paracetamol, em muitos países, é a principal causa de Hepatite Fulminante! As doses letais são realmente bem altas, acima de 10 a 15 gramas – por isso é muito difícil observar intoxicação acidental, habitualmente isso acontece em tentativas de autoextermínio, como na questão.
O examinador cobra aqui a indicação de transplante hepático nos casos de hepatite fulminante.
Há algumas décadas, um grupo de pesquisadores listou alguns marcadores de pior prognóstico na hepatite fulminante. Mais tarde, esses marcadores se mostraram úteis para definir quem seria candidato ao transplante hepático.
A. Incorreta. A N-acetilcisteína é o antídoto para a intoxicação por paracetamol e pode ser utilizada nesses casos, mas não há benefício de antibioticoterapia, já que não existe evidência de infecção bacteriana. Ao longo da internação hospitalar estes pacientes podem infectar e precisar de antibiótico, mas não é o caso no momento.
B. Incorreta. Transplante hepático está indicado! Observe que o pH é < 7.3, enquadrando a paciente nos critérios do King’s College. A prednisona não possui nenhum papel na situação descrita.
C. Incorreta. A lavagem gástrica é uma opção para os pacientes que chegam rápido ao pronto socorro, nas primeiras duas horas após a ingestão da substância. Além disso, a consciência deve estar preservada. Nossa paciente está no 3° dia de evolução, toda medicação administrada via oral já foi absorvida e – portanto – esse procedimento não está indicado. A mesma lógica se aplica ao carvão ativado. Realizar essas medidas neste momento só aumentará o risco de broncoaspiração, sem trazer qualquer espécie de benefício.
D. Incorreta. Novamente: não há indicação de antibiótico!
E. Correta. Podemos tentar a N-acetilcisteína, mas sempre tendo em mente que a paciente já tem indicação de transplante hepático!
Visão do aprovado: dá pra acertarmos essa questão sem saber de cabeça os critérios do King’s College? Dá sim! Primeiro temos que saber que não há sentido indicar lavagem ou carvão ativado de forma tão tardia. Também temos que saber que não há espaço para antibiótico ou corticoide nessa situação. A questão poderia ter sido mais cruel se exigisse do candidato o conhecimento das indicações específicas, mas aí já é demais, concordam?
A outra dica no assunto de intoxicações é tentar memorizar os tóxicos que tem antídoto. Para o parACETamol é fácil: N-ACETilcisteína!
UERJ 2019 – Mulher de 25 anos apresenta quadro de icterícia iniciada há 60 dias, associado a colúria, sem acolia fecal. Nos últimos seis meses, passou a apresentar amenorreia. Nega uso de qualquer tipo de medicamento. Ao exame físico, apresenta acne, estrias em abdome, fígado a dois dedos do rebordo costal direito, com hepatimetria de 10 cm. Os exames laboratoriais demonstram hematócrito = 40%; leucócitos = 8.000/mm³; TGO = 250 U/L; TGP = 300 U/L; bilirrubina total = 7 mg/dl; bilirrubina direta = 5,6 mg/dl; fosfatase alcalina = 240 U/L e gama GT = 70 U/L. As sorologias virais mostravam: HBsAg (-), anti-HBsAg (+), ELISA de terceira geração para vírus C negativo e anti-HAV IgM (-) e lgG (+). A dosagem de ceruloplasmina sérica apresentou resultado normal, alfafetoproteína = 10 ng/ml e o anticorpo antimúsculo liso de 1:720. O exame de lâmpada de fenda não mostrou alteração. O diagnóstico e o tratamento, respectivamente, são:
A. Hepatite autoimune/uso de ácido ursodesoxicólico e azatioprina.
B. Hepatite autoimune/uso de corticoide e azatioprina.
C. Hepatite alcoólica/uso de pentoxifilina.
D. Hepatite alcoólica/uso de corticoide.
Questão interessante sobre hepatite autoimune, cujo principal diagnóstico diferencial são as hepatites virais.
Vamos analisar o caso clínico apresentado. Mulher jovem com síndrome ictérica há 2 meses. A presença de colúria indica excesso de bilirrubina direta (hidrossolúvel). A ausência de acolia/hipocolia fecal indica que não há obstrução significativa das vias biliares (colestase), ou seja, a bile conjugada é secretada normalmente no duodeno, sendo metabolizada em urobilinogênio e urobilina, conferindo a cor usual das fezes.
A amenorreia é uma condição associada a diversas doenças hepáticas, agudas ou crônicas, assim como acnes e estrias. A hepatimetria (tamanho do fígado medida pela percussão) normal varia conforme sexo e estatura da pessoa, sendo geralmente realizada na linha hemiclavicular direita, avaliando portanto o lobo direito. Em um adulto de 1,60 m de altura, o valor esperado seria de 6,75 cm em mulheres e de 9,00 cm em homens.
Os exames laboratoriais demonstram elevação das transaminases (AST e ALT, antigamente chamadas de TGO e TGP, respectivamente) para níveis entre 3 e 10 vezes o limite superior da normalidade (entre 30 e 40 unidades por litro). Há hiperbilirrubinemia moderada, às custas de bilirrubina direta, como era esperado pelo relato de colúria. A fosfatase alcalina está discretamente alterada (limite superior geralmente fica na faixa de 140 unidades por litro) e a gama glutamil transferase (GGT) está na faixa de normalidade, não indicando, assim alteração significativa nas enzimas canaliculares.
A paciente é imune para HBV (por não termos o resultado de anti-HBc total, não podemos dizer se a imunidade é vacinal ou pós-infecciosa), suscetível a HCV e já teve infecção pelo HAV.
Na doença de Wilson ocorre acúmulo de cobre no organismo secundária a uma alteração genética que leva ao comprometimento da excreção deste cátion. A presença de ceruloplasmina (proteína transportadora de cobre no sangue) baixa sugere o diagnóstico, mas não o confirma. A confirmação se dá pela presença de anéis de Kayser-Fleischer (deposição excessiva de cobre na córnea), visualizados pela lâmpada de fenda.
A referência da alfa fetoproteína é entre 10 e 20 ng/mL, sendo que valores acima de 400 são sugestivos de carcinoma hepatocelular ou doença hepática ativa (geralmente HBV ou HCV).
A presença de anticorpo anti-músculo liso é bem sugestiva, neste contexto clínico, de hepatite autoimune.
A hepatite autoimune consiste em uma inflamação crônica e progressiva do fígado de causa indeterminada. A hepatite autoimune do tipo 1 (80% dos casos) está associada à presença de anticorpos anti-músculo liso (anti-ML) com ou sem fator anti-núcleo (FAN), ocorre principalmente em mulheres jovens ou de meia idade.
A hepatite autoimune do tipo 2 está associada à presença de anticorpos anti-fígado/rim microssomal (anti-LKM), ocorre predominantemente em crianças e tem curso na maioria das vezes fulminante. Ambos os tipos se associam com aumento IgG (ou outras gama-globulinas, como IgA e IgM).
Existe um escore diagnóstico para hepatite autoimune, que considera a presença de auto-anticorpos específicos, aumento de globulinas, alteração na histologia hepática compatível (biópsia) e ausência de hepatite viral.
O tratamento consiste em prednisona e azatioprina. A azatioprina é um imunossupressor antimetabólico, que age como antagonista do metabolismo das purinas, inibindo assim a síntese de anticorpos. Sua principal função é a de se evitar os efeitos colaterais do uso de corticoides (com características cushingoides, hipertensão, diabete e osteoporose). Os efeitos adversos mais comuns da azatioprina são gastrointestinais (anorexia, náusea e vômitos), mielotoxicidade e infecções.
A. Incorreta. O ácido ursodesoxicólico é benéfico no tratamento da colangite biliar primária (CBP), que não é um diagnóstico provável neste caso, já que a paciente não apresenta sinais de colestase, como acolia fecal e elevação de enzimas canaliculares. Queixas clássicas de CBP seriam fadiga e prurido.
B. Correta. Vide acima.
C. Incorreto. O enunciado não faz qualquer referência a uso crônico de álcool, condição óbvia para o diagnóstico de doença hepática relacionada ao álcool. O quadro também teria um curso mais agudo, cursando geralmente com náuseas, vômitos, desconforto e hipocôndrio direito e febre. Alteração laboratorial típica de hepatite alcoólica é a razão AST/ALT >2. A pentoxifilina é indicada nos casos de hepatite alcoólica com escore de Maddrey ≥ 32 e que não podem usar corticosteroides (geralmente por estarem em vigência de infecção).
D. Incorreto. Vide comentário da alternativa C. O uso de corticoides (prednisolona 40 mg ao dia, por 28 dias) indicado nos pacientes com hepatite alcoólica com escore de Maddrey ≥ 32.
Visão do aprovado: anti-músculo liso = hepatite autoimune tipo 1, típico de mulheres, jovens. anti-LKM = hepatite autoimune tipo 2, típico de crianças e com curso mais fulminante.
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Capixaba, nascido em 90. Graduado pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) e com formação em Clínica Médica pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP (HC-FMUSP) e Administração em Saúde pelo Hospital Israelita Albert Einstein (HIAE). Apaixonado por aprender e ensinar. Siga no Instagram: @joaovitorsfernando
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