E aí, galera! Tudo bem? Hoje é dia sobre os achados clínicos da endocardite infecciosa. Quando você realiza o atendimento de um paciente com prováveis sinais infecciosos, aquele quadro característico já vem na sua cabeça.
Normalmente, há febre associada a algum sinal ou sintoma que fornece um norte do foco: dispneia e tosse (pneumonias), disúria, polaciúria, hematúria (infecção de trato urinário), lesões elementares (infecções cutâneas).
Infelizmente, o mesmo não ocorre no caso das endocardites infecciosas. Aqui teremos febre e mais… uma penca de sintomas ou complicações que não necessariamente nos indicam que o foco é cardíaco! Isso torna o nosso diagnóstico difícil e muitas vezes tardio.
Por isso, temos que ter um alto grau de suspeição quando pensamos neste acometimento! Com esta introdução quero que, a partir de agora, você tenha as manifestações em mente e passe a suspeitar mais desta preciosa causa de febre, muitas vezes classificada como “de foco indeterminado”!
Vamos falar essencialmente das manifestações clínicas da endocardite infecciosa (EI) de valva do lado esquerdo, e por fim iremos pincelar algumas particularidades relacionadas à EI do lado direito.
Febre e sopro cardíaco são 2 sinais que estarão presentes em cerca de 85-90% dos pacientes, sendo a febre o sintoma mais comum.
De um modo geral, na EI aguda, a febre vem acompanhada de um estado mais toxêmico, com o paciente muito prostrado, com pouco tempo de evolução, enquanto na EI subaguda, o quadro se torna insidioso, com sintomas há semanas a meses.
Aí vem o sopro cardíaco e, vamos ser sinceros, é aqui que o bicho pega! Em primeiro lugar, muitas vezes a ausculta de sopros é negligenciada no nosso exame físico e em segundo. Às vezes você até ausculta, mas pergunta ao paciente: “você sabia que tinha sopro?” e mesmo ele respondendo “não”, você acaba acreditando ser um sopro antigo.
Em resumo, febre e sopro sempre estarão presentes no nosso paciente, mas por conta do fato do sopro ser negligenciado, temos em suma um paciente com febre. E muita coisa pode dar febre, não é mesmo? Por isso o diagnóstico da EI acaba sendo tardio!
Por conta do que acabamos de conversar acima, são justamente os outros sinais e sintomas que podem estar presentes na EI que nos levarão a esta suspeita.
Entenda que a endocardite infecciosa é uma condição que envolve bacteremia, mas que acaba colonizando uma vegetação estéril prévia (decorrente de dano ao endotélio cardíaco, transformando-a em uma vegetação infectada).
No entanto, isso não deixa de ser uma bacteremia. Então, achados sistêmicos em outros órgãos podem ser encontrados nos pacientes. Classicamente, são divididos em complicações/fenômenos locais, embólicas e/ou imunológicas.
Aqui estão incluídas condições decorrentes da própria vegetação acometendo o coração, sendo as complicações mais comuns da EI.
A insuficiência cardíaca é a mais frequente, observada principalmente quando a valva aórtica é acometida (mas lembre-se de que a principal valva acometida é a mitral!). Em geral, o acometimento valvar gera quadro de insuficiência das valvas, não de estenose.
Bloqueios de ramo, incluindo BAVT, podem surgir quando temos acometimento do endotélio septal. A persistência de febre, a despeito da terapia antimicrobiana adequada, deve nos fazer suspeitar de outra complicação local: o surgimento de abscessos perivalvares.
Por fim, mas não menos importante, a infecção endotelial pode infectar os tecidos subjacentes, acometendo o miocárdio, pericárdio e levando até mesmo a um quadro de pericardite, além de dor torácica e tamponamento cardíaco.
São as condições decorrentes da circulação de imunocomplexos circulantes, e de cara já te solto que em até 50% dos pacientes o fator reumatoide pode estar positivo.
Para complicar ainda mais a situação, a glomerulonefrite, com surgimento de hematúria, pode estar presente, também, em 50% destes pacientes. Imagine o quadro: febre, um sopro aleatório (que você muitas vezes ignora), fator reumatoide positivo e hematúria dismórfica.
Novamente: veja que a endocardite infecciosa é uma infecção sistêmica que promove um quadro florido, muitas vezes de difícil diagnóstico, por isto nossa suspeição deve ser alta!
Outros fenômenos imunológicos incluem as Manchas de Roth, hemorragias ovais, arredondadas ou em forma de chama com uma mácula branca no centro (que representa um aglomerado de fibrina) e os nódulos de Osler, nódulos pequenos e dolorosos (este fato é importante, pois diferencia bem das Manchas de Janeway que são indolores), que acometem principalmente os quirodáctilos e pododáctilos.
Como o próprio nome sugere, são fenômenos decorrentes do desprendimento de pedações da vegetação que se distribuem sistemicamente.
Lembre-se de que as principais valvas acometidas são a mitral e depois a aórtica, logo, desprendimentos irão gerar êmbolos que progridem para a circulação sistêmica.
Enquanto isso, na EI exclusiva do coração direito, temos como principal valva acometida a tricúspide, assim, os desprendimentos irão atingir a circulação pulmonar, gerando embolia séptica pulmonar.
A principal complicação embólica da EI exclusiva de lado esquerdo são as neurológicas, e os pacientes podem cursar com Acidente Vascular Isquêmico (AVEi) Embólico, hemorragias intracranianas, abscessos cerebrais e o famigerado aneurisma micótico.
Mas o que seria isto? Aneurisma micótico não tem nada a ver com fungo, na verdade são decorrentes de êmbolos sépticos que atingem a vasa vasorum dos vasos intracranianos, promovendo destruição e afrouxamento das paredes destas arteríolas, gerando, assim, os aneurismas micóticos.
Da mesma forma que atingem o SNC, os êmbolos sépticos podem atingir outros órgãos e causar infarto destes: fígado, baço e os rins são os principais.
Os fenômenos embólicos também podem gerar alguns achados peculiares na EI. Um deles é composto pelas manchas de Janeway, que são máculas eritematosas indolores (lembra que comentamos acima sobre a questão da dor?) que predominam em mãos e pés, sendo mais comuns na EI aguda.
Outros achados são as petéquias que podem ser cutâneas ou em mucosas (como as conjuntivas) e as hemorragias em estilhaços (ou em lasca), encontradas nos leitos ungueais.
Os êmbolos sépticos acabam por “chuveirar” infecção para diversos locais, e algumas infecções podem surgir como complicações de um quadro de EI.
Novamente, devemos nos lembrar destas complicações principalmente em pacientes que persistem com quadro de febre a despeito de uma antibioticoterapia adequada:
Frequência dos principais achados | |||
Achado | ƒ | Achado | ƒ |
Febre | 90% | Petéquias | 40% |
Sopro | 85% | Embolia Séptica (infarto rins, baço e outros órgãos | 25% |
Manifestações neurológicas | 40% | Manchas de Roth / Nódulos de Osler | < 2% |
Dando uma pincelada na EI do coração direito: a principal valva acometida é a tricúspide e, portanto, diferentemente do acometimento do coração esquerdo, aqui teremos majoritariamente insuficiência cardíaca direita (representado por congestão sistêmica) e complicações pulmonares!
Mas veja, é uma apresentação extremamente atípica, pois para você ter ciência, por ordem decrescente de acometimento valvar temos: mitral → aórtica → mitro-aórtica → tricúspide.
Isto é: a valva tricúspide ser acometida isoladamente é algo extremamente raro e que está relacionado, principalmente, à infecção pelo Staphylococcus Aureus.
Um dado importante nas manifestações clínicas é que, diferentemente da EI do coração esquerdo em que o sopro acomete cerca de 80-90% dos pacientes, aqui o sopro comumente está ausente!
O que vai estar presente em cerca de 70-80% dos pacientes são as consequências da “chuveirada” de êmbolos sépticos em direção à circulação pulmonar: tosse, dor torácica pleurítica, hemoptise e dispneia.
As complicações destes êmbolos incluem múltiplos infartos/abscessos pulmonares, derrame pleural, empiema e até pneumotórax.
Mas e aí? Gostou de saber mais sobre os achados clínicos da endocardite infecciosa? Se você quiser aprender muito mais sobre diversos outros temas, conheça o PSMedway! Esse é nosso curso de Medicina de Emergência, que irá te preparar para a atuação médica dentro da Sala de Emergência!
Caso tenha ficado curioso, aproveite o conteúdo do curso por 7 dias gratuitos! Assim, você turbina seus conhecimentos e aproveita para mandar bem no plantão. Inscreva-se já!
Até a próxima!
Paraense, forjado em 1990. Residência em Clínica Médica pelo Hospital Israelita Albert Einstein (HIAE). Neto de professor que me transferiu o amor pelo magistério. Apaixonado pelo raciocínio clínico, por uma boa resenha, viagens e novas experiências. Siga no Instagram: @rodrigocfranco