Existem diversas doenças pulmonares que vemos no dia a dia ou estudamos para as provas de residência. Após os anos de ciclo básico e clínico, no internato, estamos habituados a observar sinais e sintomas e associá-los a patologias logo de cara, já pensando em tratamento. Mas sem determinados elementos da anamnese e exame físico, nunca chegaríamos a tal conclusão! Um desses elementos imprescindíveis é a ausculta pulmonar.
De acordo com o mestre da Semiologia, Celmo Celeno Porto, “a ausculta é o método semiológico mais importante no exame físico pulmonar”. Isto porque, por meio dela, podemos analisar o funcionamento dos pulmões. Você tem usado essa ferramenta adequadamente?
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A priori, a pessoa que realizará o exame deve se colocar atrás do paciente. Este deve estar com o tórax despido, e respirar pausada e profundamente. Orienta-se ao paciente que inspire o ar pelo nariz e o solte pela boca, entreaberta, sem emissão de ruídos neste processo.
Então, utiliza-se o estetoscópio (da forma correta: headsets e olivas para a frente) e, com o diafragma, inicia-se a ausculta no dorso e, se necessário, na região ventral, posicionando o diafragma a quatro dedos transversos abaixo das clavículas, preferencialmente fazendo a ausculta em “barra grega”, visando fazer um estudo auscultatório comparativo e simétrico dos hemitórax. Não esquecer de auscultar as laterais, nas linhas hemiaxilares.
Ausculta em barra grega.
Os sons são produzidos através da vibração de corpos em um meio elástico. No vácuo, por exemplo, que é um meio inelástico, não há som. A mecânica respiratória produz turbulência aérea e vibração da estrutura pulmonar e a partir de então são produzidas as diversas sonoridades que auscultamos no exame físico dos pulmões.
Pode ser auscultado ao posicionarmos o diafragma do estetoscópio posicionado sobre o pescoço. Este som é originado ao nível de faringe, laringe e traqueia – regiões onde o fluxo aéreo é turbulento e ágil. É caracterizado por uma inspiração rude e bem audível, seguido de pausa e expiração de caráter similar à inspiração.
É o mais conhecido e citado nos exames físicos por aí. Após a passagem turbulenta pela traquéia, o ar chega às grandes vias aéreas, quando o fluxo deixa de ser ruidoso e passa a ser transicional. Em suma, este som é caracterizado por uma inspiração de intensidade e duração maior, bem audível e suave, seguido de uma expiração curta e menos audível. Por ter origem mais periférica e regional, a inspiração é mais audível quando comparada à expiração, que por sua vez é originada de forma mais central, longe do foco de ausculta.
Audível nas regiões do tórax correspondentes aos ápices pulmonares, aparecendo normalmente em regiões supra escapulares e interescapulo-vertebrais. Trata-se de um som intermediário entre murmúrio vesicular e som bronquial. Nas regiões de ausculta, a densidade parenquimatosa é menor, havendo menos interferência sobre a transmissão de som – sendo um som menos rude que o bronquial e mais áspero que o murmúrio vesicular.
TIPO DE SOM | LOCAL DE AUSCULTA |
Murmúrio vesicular | Periferia dos pulmões |
Som brônquico | Áreas de projeção dos brônquios principais |
Som broncovesicular | Regiões esternal superior e interescapulovertebral superior |
Laennec, no ano de 1819, categorizou em francês a palavra “râle” (estertor) para todo ruído diferente da respiração fisiológica. Essa classificação nos deu a base para os sons anormais que utilizamos atualmente.
Ruídos Adventícios: Classificação de Laennec.
Nome orginal | Tradução | Comentários |
Râle humide ou créptation | Estertor úmido ou crepitação | “Som produzido pela crepitação do sal que se deita no fogo”. |
Râle muqeux ou gargouillement | Estertor mucoso ou gargarejo | “Traqueia e brônquios com secreção”. |
Ralê sec sonore ou Ronflement | Estertor seco sonoro ou ronco | “Arrulho de um pombo” |
Râle sec sibilant ou sifflement | Estertor seco sibilante ou silvo | “Assobio das aves”. |
Atualmente, pode-se realizar uma divisão didática entre sons contínuos e descontínuos.
são sons originados das vibrações de paredes brônquicas e de conteúdo gasoso por conta do estreitamento destas vias, seja por espasmo ou edema da parede, bem como presença de secreção aderida. São dois tipos:
Roncos: sons de baixa frequência, graves.
Sibilos: sons de alta frequência, agudos. Em geral, são múltiplos e disseminados por todo o tórax, exceto quando se trata de aspiração por corpo estranho (ou outra forma, como uma neoplasia obstrutiva) – neste caso os sibilos são localizados. Mais comumente, são audíveis principalmente em distúrbios obstrutivos, como na asma – com sintoma característico conhecido como “chiado no peito”.
Representados amplamente pelos estertores.
Estertores finos ou crepitantes: ocorrem no final da inspiração, possuem alta frequência (agudos) e têm curta duração, e costumam aparecer ao fim da inspiração. Não se modificam com a tosse. Comumente são comparados ao atrito de cabelos próximo à orelha.
Estertores grossos ou bolhosos: possuem menor frequência e uma duração superior à dos citados no tópico anterior. Estes sim se alteram com a tosse, e são auscultáveis globalmente nos hemitórax. Geralmente, são audíveis no início da inspiração e durante toda a expiração. De acordo com o livro de Semiologia de Marío Lopez, os estertores grossos parecem ter origem na abertura e fechamento de vias aéreas respiratórias, contendo secreção viscosa e espessa, bem como por afrouxamento da estrutura de suporte das paredes brônquicas. Este mesmo livro traz um roteiro para classificar os ruídos adventícios:
Roteiro básico para classificação dos ruídos adventícios
Som contínuo ou de curta duração? |
Em que fase respiratória o ruído se encontra?Na inspiração ou expiração?Logo inicialmente à inspiração ou ao final?Nas duas fases? |
O ruído é grosso ou fino? |
Fixo ou variável com a tosse? |
Marío Lopez – As bases da Semiologia Médica, 5ª ed.
Dessa forma fica mais fácil de diferenciar os estertores, né?
Outros tipos de sons
O estridor é classificado por algumas literaturas como um tipo especial de sibilo, com maior intensidade na inspiração, audível a distância, que ocorre por obstruções altas (laringe e traqueia) – muito comum e conhecido pela laringotraqueobronquite, ou crupe, que tem como característica evidente o estridor laríngeo, concomitante à tosse ladrante. Existe também o atrito pleural, que é audível nas duas fases da respiração, tendo um ruído variável no aspecto de duração. É imputado ao atrito entre as pleuras quando inflamadas durante a mecânica ventilatória.
É isso, galerinha. A semiologia pulmonar é muito bonita, e é um dos mais acurados recursos que temos na busca de compreender diversos quadros que muitas vezes não precisam de outro exame a não ser o físico para serem diagnosticados. Agora que você já sabe mais sobre a ausculta pulmonar, confira a Academia Medway! Por lá tem vários conteúdos gratuitos como e-books e minicursos pra você continuar aprendendo.
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*Colaborou: Emilli Lorrayne Bertão Vieira
Nascido em 1993, em Maringá, se formou em Medicina pela UEM (Universidade Estadual de Maringá). Residência em Medicina de Emergência pelo Hospital Israelita Albert Einstein.