AVC Hemorrágico: Tudo sobre hemorragia subaracnóidea

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Nossa conversa hoje será sobre o temido AVC hemorrágico. Sabemos que este pode ser dividido em dois tipos:

  • Hemorragia intraparenquimatosa (HIP)
  • Hemorragia subaracnóidea (HSA)

Aqui, neste texto, iremos destrinchar a HSA, no qual é um sangramento que ocorre dentro do espaço subaracnóideo decorrente de uma ruptura de de um aneurisma intracraniano em 80-85% dos casos de HSA. Bora?

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Por que este assunto é importante?

Vamos por partes, primeiro alguns dados epidemiológicos:

  • A HSA representa cerca de 10% de todos AVC
  • Incidência de 10 a 15 casos de HSA a cada 100.000 pessoas/ano
  • Mortalidade = 32%
  • Cerca de 20% dos sobreviventes ficam com sequelas neurológicas significativas 
  • Cerca de 46% dos sobreviventes podem ter comprometimento cognitivo de longo prazo
  • Cerca de 10 a 15% morrem antes de chegar ao hospital
Fonte: MSD Manuals

Quais os fatores de risco?

  • Tabagismo (risco relativo: 2-7)
  • Hipertensão arterial sistêmica (risco relativo: 2,5)
  • Deficiência estrogênica
  • Genética (familiar de 1º grau)
  • Consumo de álcool
  • Terapia antitrombótica
  • Doença renal policística
  • Síndrome de Marfan
  • Coarctação de aorta

Qual a clínica do paciente? 

O paciente chega no serviço de emergência com quadro súbito e os possíveis sinais e sintomas do AVC hemorrágico são:

  • Cefaleia súbita (“thunderclap”) e intensa (97% dos casos / Descrita como a “pior cefaleia da vida” em 80%)
  • Náusea (77%) 
  • Vômitos
  • Dor cervical
  • Fotofobia
  • Perda de consciência (50%) – normalmente transitória

Obs: Existe também a chamada “cefaleia sentinela” que é descrita como uma cefaleia que ocorre cerca de 1 a 2 semanas antes da ruptura do aneurisma (ocorre em até 43% dos quadros de HSA).

Exames complementares

Inicialmente o paciente deve ser submetido a exames laboratoriais que incluem: hemograma; função renal; eletrólitos; coagulograma;glicemia.  Além de um eletrocardiograma.

Os exames de neuroimagem são obrigatórios e são a pedra angular no diagnóstico do AVC hemorrágico. Por isso, atenção aqui!

Primeiro, entenda que aqui não podemos comer bola, então a situação ideal é o serviço pré-hospitalar ligar para o hospital e avisar que estão levando um possível AVC, para que já se organize os fluxos e o exame de neuroimagem seja realizado o mais rápido possível.

TC de crânio sem contraste: Exame de escolha – “padrão ouro”

  • Muito sensível (Sensibilidade de 92% quando realizada nas primeiras 24h e > 95% se feita na primeira hora)
  • Lesão hiperdensa nos sulcos e cisternas encefálicas
Fonte: Emergência USP – TC crânio com sangramento em espaço subaracnóideo (seta preta)

RM de crânio: Opção (Sensibilidade similar à TC, mas menos validada nos serviços de emergência)

  • Sinal hiperintenso em T2 representa sangramento

E se o exame de neuroimagem (TC ou RM) vier negativo ou questionável?

Atenção! Se tiver suspeita de HSA com exame de neuroimagem normal deve ser realizada uma punção lombar!

Punção lombar: Coletar 4 tubos para contagem de hemácias

  • Pressão de abertura aumentada
  • Contagem aumentada de hemácias (que não diminui entre o primeiro e o último tubo – se começar saindo sangue e terminar sem sangue foi apenas um acidente de punção, mas se continuar saindo… HSA meu amigo)
  • Xantocromia (coloração amarelada) que costuma aparecer após 12 horas decorrente da destruição das hemácias
Fonte: MSD Manuals – Demonstração de uma punção lombar

Angiografia cerebral digital: Exame de escolha para o diagnóstico etiológico

Angiotomografia: Menos invasivo que a angiografia (pode ser o primeiro exame)

Angiorressonância: Opção

Classificações

Na avaliação inicial do paciente com AVC hemorrágico do tipo HSA temos duas escalas mais utilizadas:

  • Hunt-Hess: Gravidade/prognóstico
Classificação de Hunt-Hess
0Assintomático + sem sangramento
IaAssintomático + com sangramento
IIaSinais meníngeos
IIbSinais meníngeos + déficit focal
IIIaGlasgow 13-14
IIIbGlasgow 13-14 + déficit focal
IVaGlasgow 9-12
IVbGlasgow 9-12 + déficit focal
VComa
  • Fisher modificada: Risco de vasoespasmo
Classificação de Fisher modificada
0Ausência de sangue visível
1Mínima HSA + Sem hemoventrículo
2Mínima HSA + Com hemoventrículo
3HSA densa + Sem hemoventrículo
4HSA densa + Com hemoventrículo

Antes de falarmos do tratamento de um AVC hemorrágico, é sempre importante lembrar que saber desconfiar de um AVC é fundamental, afinal, é uma doença muito comum de surgir no PS. Sabemos que o manejo desses pacientes com AVC não é fácil e, principalmente por ser uma corrida contra o tempo, não diagnosticá-lo pode alterar completamente a vida do doente. No nosso e-book gratuito AVC: do diagnóstico ao tratamento, te ensinamos o manejo do AVC, desde o primeiro contato com o paciente até a alta hospitalar. Informação nunca é demais, então que tal dar uma olhada lá também? Clique AQUI e baixe gratuitamente!

Caiu a casa, é um AVC hemorrágico, como eu trato?

Geral

  • Monitorização, transferência para UTI e avaliação urgente da neurocirurgia
  • Atenção para coagulopatia e plaquetopenia: descontinuar possíveis agravantes (heparina / anticoagulantes / antiagregantes) e reverter com terapias específicas
  • Analgesia
  • Evitar hipoglicemia e hiperglicemia (Alvo: HGT 80-120 mg/dL)
  • Manter temperatura ≤ 37,8ºC
  • Profilaxia de úlcera de estresse
  • Manter níveis de hemoglobina entre 8-10 g/dL

Manejo da PA

  • Antes do tratamento do aneurisma: Manter PAS < 160 mmHg / PAD < 110 mmHg
  • Após correção do aneurisma: Manter PAS < 200 mmHg

Hipertensão intracraniana (HIC)

  • Monitor de pressão intracraniana (PIC) se: Ventrículos aumentados / escore CFIN ≥ 3
  • Se monitorização por PIC recomenda-se: PIC < 20 mmHg e pressão perfusão cerebral (PPC) > 70 mmHg
  • Se hipertensão intracraniana (HIC): Cabeceira elevada 30º / Sedação leve

Cirurgia

  • Realizar o mais precocemente possível para reduzir o risco de ressangramento: Clipagem cirúrgica ou abordagem endovascular

Prevenção de vasoespasmo

  • O vasoespasmo ocorre normalmente entre o 3 e o 14º dia após a HSA
  • Cerca de ½ dos pacientes desenvolve vasoespasmo assintomático
  • Cerca de ⅓ dos pacientes desenvolve vasoespasmo sintomático
  • Dentre os pacientes que apresentam vasoespasmo, 15-20% desenvolvem isquemia cerebral ou morrem
  • Clínica: Cefaleia / Sinais meníngeos / Febre baixa / Taquicardia
  • Prevenção de vasoespasmo (indicado para todos pacientes com HSA): Nimodipina 60mg VO 4/4h por 14-21 dias
  • Nimodipina não diminui a incidência de vasoespasmo, mas melhora o prognóstico neurológico
  • Tratamento do vasoespasmo: Hipervolemia discreta / Estatinas (controverso) / Angioplastia ou vasodilatadores intra-arterial (tratamento definitivo)

Para encerrar

Calma, respira. Sei que aprofundei bastante, principalmente no tratamento da HSA, mas é porque não queria te entregar esse conteúdo com pontos sem nó.

O que você DEVE saber, na ponta da língua, para atuar ali na chegada do paciente com AVC hemorrágico na emergência:

  • Reconhecer o quadro e solicitar uma TC crânio sem contraste rapidamente
  • Suspeita de HSA com exame de neuroimagem normal = Punção lombar
  • Monitorização + Leito UTI + Avaliação neurocirúrgica
  • Suporte: Alvo PA < 160×110 mmHg / Alvo HGT 80-120 mg/dl / Avaliar medicações em uso possivelmente deletérias / Evitar febre
  • Prevenção de vasoespasmo: Nimodipina 60mg VO 4/4h por 14-21 dias

É isso! Esperamos que tudo sobre AVC hemorrágico tenha ficado mais claro. Mais uma coisa: quer ver conteúdos 100% gratuitos de medicina de emergência? Confira a Academia Medway! Por lá, disponibilizamos diversos e-books e minicursos. Enquanto isso, que tal dar uma olhada no nosso Guia de Prescrições? Com ele, você vai estar muito mais preparado para atuar em qualquer sala de emergência do Brasil!

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BrunoBlaas

Bruno Blaas

Gaúcho, de Pelotas, nascido em 1997 e graduado pela Universidade Federal de Pelotas (UFPEL). Residente de Clínica Médica na Escola Paulista de Medicina (UNIFESP). Filho de um médico e de uma professora, compartilha de ambas paixões: ser médico e ensinar.