O gerente enlouqueceu, e ele garante que vai te ensinar a diagnosticar a causa da acidose metabólica até o fim desse texto de uma forma bastante descomplicada.
A gasometria é aquele exame que o interno adora coletar e odeia interpretar. Porém, hoje vamos mudar essa situação. Chega de passar vergonha no QG da nefro: fique aqui para entender o distúrbio que causa medo até em alguns R2 de Clínica Médica.
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Voltando ao assunto, hoje, começaremos a partir de uma gasometria arterial com pH baixo e bicarbonato baixo. Depois, vamos desbravar os caminhos da acidose metabólica. Caso você não esteja familiarizado com os distúrbios simples, comece por aqui ou por aqui.
“Para a maior parte das pessoas, os caminhos da acidose metabólica são um labirinto sem saída. Pense neste texto como um mapa para guiá-lo nesta jornada. Sempre que necessário, volte nele para encontrar o caminho até o diagnóstico.
Ele foi escrito com uma linguagem simples e direta. O passo a passo bem definido deixa poucas brechas para a confusão, de modo que você não irá se perder no meio do caminho. Boa sorte nessa jornada.”
Para começar, pegue a gasometria e compare com os valores de referência. Na acidose, o pH vai estar mais baixo do que 7,35.
VALORES DE REFERÊNCIA PARA GASOMETRIA ARTERIAL
pH | 7,35 a 7,45 |
Bicarbonato | 22 a 26 |
PCO2 | 35 a 45 |
Confira se:
Na acidose metabólica, o PH está baixo e o bicarbonato também.
Se o bicarbonato diminui, o pH diminui. Se a PCO2 aumenta, o pH diminui.
Distúrbio | pH | pCO2 | Bicarbonato |
Acidose metabólica | ⇩(BAIXO) | Tanto faz | BAIXO |
Alcalose respiratória | ⇧ | BAIXO | Tanto faz |
Alcalose metabólica | ⇧ | Tanto faz | ALTO |
Acidose respiratória | ⇩ | ALTO | Tanto faz |
Até aqui, já definimos que é uma acidose metabólica. Mas será que a PCO2 está dentro do esperado?
Quando o bicarbonato e o pH estão baixos, temos uma acidose metabólica.
No momento em que isso acontece, o nosso corpo tenta diminuir o PCO2 respirando mais rápido, para tentar segurar um pouco o pH.
PCO2 esperado = 1,5 x BICARBONATO + 8 +-2 |
Se a PCO2 aumenta, o pH diminui. Se a PCO2 diminui, o pH aumenta.
acidose metabólica isolada;
Acidose metabólica associada à alcalose respiratória;
Acidose metabólica associada à acidose respiratória.
Aproveitando, no e-book Manual da gasometria arterial: distúrbios ácido-básicos, falamos tudo sobre como interpretar uma gasometria arterial com rapidez e segurança, inclusive sobre como raciocinar a partir das principais causas de distúrbios ácido-básicos vistas ao longo dos seus estudos. Faz já o download dele clicando AQUI e comece a se aprimorar.
AG aumentado | AG normal |
Acidose láctica tipo A (choque)ou tipo B | Perda GI de bicarbonato:–Diarreia-Drogas (Cloreto de cálcio; Sulfato de magnésio)-Drenagem pancreática |
Cetoacidoses-Diabética-Alcoólica-Jejum | Acidose de origem grenal:-HipoK+:ATR 2 (proximal)ATR 1 (DISTAL) -HiperK+:–Deficiência mineralocorticoides |
Intoxicações:-Metanol-Etilenoglicol-Ac. piroglutâmico-Salicilatos | Induzidas por fármacos:–Poupadores de potássio-TrimetoprimIECA/BRA/AINE-Tacrolimus-Heparina |
Injúria renal aguda/ Uremia | Sobrecarga volêmica (SF 0,9%) |
Resinas trocadoras (SORCAL) |
O bicarbonato pode cair por 4 motivos:
*: ingeriu ácido (metanol, por exemplo) ou produziu ácido (ácido lático, por exemplo) ou não consegue mandar ácido embora (Acidose tubular renal)
Mas, então, como descobrimos qual dessas quatro é a causa da acidose metabólica?
Calcule o ANION-GAP do sangue (AG sérico).
ANION-GAP sérico = SÓDIO – (CLORETO + BICARBONATO) |
Corrija o ANION GAP sérico (AG sérico) pela albumina.
AG sérico corrigido = AG sérico + 2,5x (4,0 – albumina) |
Significa PERDA DE BICARBONATO e/ou ACÚMULO DE CLORO. Seguir para ETAPA 3A;
Significa que há mais ácidos do que o devido associados ou não à perda de bicarbonato.
Seguir para ETAPA 3B.
Nosso sangue precisa manter neutralidade de carga. Por isso:
Cátions possíveis de medir + cátions impossíveis de medir = ânions possíveis de medir + ânions impossíveis de medir |
No entanto, existem mais Ânions impossíveis de medir do que cátions, por isso o ANION-GAP.
Novos ácidos entram no sangue na forma de ânions: ocorre aumento do anion gap (cloreto se mantém normal = NORMOCLORÊMICO);
Ocorre perda de bicarbonato: o corpo promove aumento de cloreto para manter a neutralidade de carga do sangue. (HIPERCLORÊMICO).
Possíveis causas do ABCD:
A Adisson;
B Bicarbonato perdido;
C Cloro em excesso;
D Diuréticos.
Calcule o ANION GAP urinário. Ele vai fazer a diferenciação entre:
AG urinário = Sódio urinário + Potássio urinário – Cloreto urinário |
Os rins se tornam incapazes de produzir tampão (amônia) para o pH ácido da urina, de modo que há perda de bicarbonato pela urina.
Divide-se em:
Ex: corpo perde bicarbonato pela diarreia, logo o sangue fica mais ácido. Para compensar os rins produzem amônia, a qual é eliminada na urina e se liga ao hidrogênio eliminado.
Se o AG está aumentado, temos que pensar em mais ácido.
E, sim, vai ter mnemônico.
MUD PILES.
M Metanol
U Uremia
D Diabetes (Cetoacidose)
P Paraldeído (sedativo que já foi descontinuado)
I Isoniazida e Ferro
L Lactato
E Etilenoglicol
S Salicilatos
Como está o lactato?
A acidose metabólica com AG aumentado por acidose lática se divide em duas:
Basicamente o oxigênio não está chegando nas células, então ocorre isquemia tecidual e elas entram em atividade anaeróbia, isso produz ácido lático.
Ex.: Choque séptico, choque hipovolêmico, choque cardiogênico, choque distributivo;
Medicamentos: metformina, beta-agonistas (salbutamol, adrenalina e dobutamina);
Erros inatos do metabolismo;
Deficiência de tiamina.
É preciso verificar se há cetose, sendo a hora de dosar a cetonemia ou cetonúria do paciente.
As cetonas são acetona, acetoacetato e beta-hidroxibutirato.
A cetonemia tende a ser mais confiável.
“Ausente estando a cetose, seguir para o passo 3 você deve. Mais investigação a fazer ainda há.”
Tem-se injúria renal? Serão pesquisadas ureia e creatinina do paciente.
Acidose metabólica de anion-gap aumentado, secundária a injúria renal.
Faz-se necessário calcular a osmolaridade sérica.
OSM. SÉRICA CALCULADA: 2x Sódio + glicose/18+ ureia/9 |
Calcule o GAP OSMOLAR para avaliar intoxicações.
GAP OSMOLAR = OSMOLALIDADE SÉRICA MEDIDA – OSMOLARIDADE SÉRICA CALCULADA |
OsmolaLidade medida: (mmol/kg) de solvente
OsmolaRidade calculada: (mmol/L)
As unidades de medida são diferentes. Mesmo assim, há aplicação clínica para esse dado.
Hora de se deparar com Delta/delta.
Delta/delta = (Anion GAP – 10) / (24 – bicarbonato) |
Nesse caso, o paciente possuirá duas acidoses metabólicas, sendo uma de AG normal e outra de AG aumentado. Por exemplo, Cetoacidose diabética (AG aumentado) associada a acidose hiperclorêmica por excesso de SF 0,9% (AG normal).
Corra para o abraço. Agora, você pode tirar onda no round e largar na lata aquela interpretação de gasometria!
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CASTILHO, J. B. et al. Avaliação da acidose metabólica em cirurgia de grande porte. Rev Med Minas Gerais 2010; 20(2 Supl 3): S3-S11. Disponível em: <http://rmmg.org/artigo/detalhes/1012>
LEAL, V. O et al. Acidose metabólica na doença renal crônica: abordagem nutricional. Comunicação • Rev. Nutr. 21 (1) • Fev 2008 • https://doi.org/10.1590/S1415-52732008000100010
Gaúcho. Médico formado pela UFPEL, residente de Ginecologia e Obstetrícia na UFMG. Tenho 2,04m de altura, sou cozinheiro cria da quarentena e tenho FOAMed na veia. Bora junto!