Fala, pessoal, tudo bem com vocês? Hoje vamos falar sobre corpo estranho no ouvido na população pediátrica. Todos nós, durante o internato de pediatria ou mesmo na residência, já nos deparamos com algum objeto criativo no conduto auditivo externo das crianças. Mas e aí? O que fazer? Lavar? Tentar retirar manualmente? Chamo ajuda? O que preciso saber antes de mexer?
Calma! Te explico tudo a seguir. Bora?
Simples: examinando! Nem sempre você vai se deparar com algum sintoma, corpos estranhos pequenos e inertes muitas vezes não causarão sintomas e a única forma de descobrir é pela otoscopia. Uma otoscopia bem feita é fundamental e faz parte do exame físico inclusive das consultas de puericultura. Ela não é menos importante que outros exames, sempre lembrem da otoscopia!
Algumas crianças te ajudam e te contam que colocaram algo no ouvido, às vezes te falam até o que era, o que facilita muito o exame. Em outros casos, há o relato pelos pais de uma confissão da criança ou mesmo os pais viram a criança introduzir algo no ouvido.
Geralmente durante o período pré-escolar e início do período escolar é quando a criança é mais curiosa e mais propensa a introduzir objetos no ouvido. Antes dessa idade é mais raro, nestes casos normalmente o relato será da mãe que, voluntariamente, introduziu algo no ouvido da criança, seja haste flexível, algodão ou algum outro objeto de fim supostamente medicinal. Em crianças mais velhas, principalmente com algum grau de déficit cognitivo ou transtorno psiquiátrico, também é importante a suspeita.
Com certeza! Crianças com queixa de otalgia ou mesmo que colocam suas mãos nos ouvidos e choram são sempre suspeitas de corpo estranho. Nos mais velhos, a queixa pode ser de não estar escutando ou mesmo tontura. Lembrem-se: a criança não sabe relatar tontura corretamente! Então suspeitem sempre se houver história de crianças que caem com facilidade ou mesmo após movimentos simples, não esperados para idade de desenvolvimento.
Os sintomas podem não ser agudos. A manifestação dos sintomas de corpo estranho nasal é muito mais precoce que a otológica! Corpo estranho no ouvido, a depender da natureza, pode passar dias, semanas ou até meses sem que ninguém perceba. É importante suspeitar nos casos de otorreia refratária ao tratamento em paciente sem histórico prévio de otite média crônica. A otoscopia é imprescindível!
É comum a confusão de corpos estranhos com o cerume. O cerume pode adquirir formas e colorações bem similares a corpos estranhos a olhos não treinados, e a otoscopia numa criança pode ser algo muito difícil. Nos pequenos o conduto é estreito, mas os pacientes são mais fáceis de conter. A otoscopia numa criança grande com dor no ouvido pode ser uma verdadeira batalha, porém, necessária. É fundamental tentar observar completamente o conduto auditivo e a membrana timpânica.
Em alguns casos, o edema não permite a visualização completa do conduto. Nesses casos, o mais importante é afastar que o corpo estranho não seja algo vivo, corrosivo ou cáustico. Afastadas essas causas, é possível que antes de se tentar retirar, diminua o processo inflamatório com gotas otológicas. Num segundo momento, a visualização ficará mais fácil, tanto pela redução do edema quanto pelo ambiente mais tranquilo com a criança com menos otalgia.
Difícil adivinhar. Crianças são muito criativas. É comum encontrarmos peças de brinquedo, roda de carrinho, cabeça de boneco, massa de modelar, partes de brincos ou papeis. Algumas crianças têm o pé na cozinha, introduzem feijão, milho, arroz e outras sementes.
Se a queixa do paciente for súbita, com a criança muitas vezes chorando e relatando barulho no ouvido, desconfiar de algum inseto vivo dentro do conduto.
Dica de ouro: se você não tem luz, material adequado ou não sabe o que fazer, não mexa! A menos que seja um material corrosivo, como pilhas ou baterias, e você esteja muito distante de um especialista. Tentar mexer e não conseguir remover o corpo estranho, deixará a criança assustada, o conduto edemaciado e sangrante e, possivelmente, poderá causar mais danos ao já causado pelo próprio corpo estranho
Por mais que a criança tente introduzir o corpo estranho, a sua capacidade é limitada pelo conduto estreito. Portanto, muitas vezes o objeto vedará o conduto. Manipular erroneamente nestes casos pode ajudar a introduzir ainda mais o corpo estranho e possivelmente causar mais danos, tanto ao conduto quanto à membrana timpânica.
Em caso de insetos vivos, é fundamental a imobilização do animal antes da tentativa de retirada. Utilizar algum líquido no conduto auditivo, como vaselina ou líquidos anestésicos pode neutralizar o inseto, amenizar a dor e facilitar a retirada.
Depende. Corpos estranhos inertes não biológicos, como brinquedos, borracha, massa de modelar podem facilmente ser removidos com lavagem otológica. Porém, quando se trata de grãos ou sementes, o ideal é evitar a lavagem otológica pelo risco de absorverem água e obstruírem ainda mais o conduto, dificultando a retirada. Nestes casos, é preferível a utilização de curetas ou pinças frias. Papeis ou pequenos pedaços plásticos também podem ser retirados com pinças ou curetas otológicas.
É fundamental que a criança esteja o mais colaborativa possível, caso contrário, o risco de lesão pode ser maior que o do próprio corpo estranho! Em alguns casos será necessária contenção física ou até mesmo sedação para realização do procedimento.
Chame ajuda. Não tente lavar ou remover, é improvável que tenha sucesso a olho nu. Uma vez que o corpo estranho atravessa a membrana timpânica e cai na orelha média, é necessária avaliação por imagem da localização precisa do corpo estranho, bem como proximidade com estruturas nobres, como o vestíbulo, ossículos e nervo facial. Nestes casos, a solicitação de uma tomografia computadorizada de ouvidos e mastoides com cortes finos ajudará e trará segurança numa eventual extração em centro cirúrgico.
Também depende. Se o tempo entre a introdução do corpo estranho e a sua retirada for curta, quase que imediata, não há necessidade. Em casos em que o corpo estranho estava há alguns dias, principalmente gerando uma reação de corpo estranho, com edema, hiperemia e otorreia, o uso de gotas otológicas está indicado. Antibioticoterapia sistêmica quase nunca é necessária nesses casos.
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Grande abraço e até a próxima!
Nascido em 1991 em Urussanga-SC, Arthur é formado em Medicina pela UFSC e fez residência médica em Otorrinolaringologia e Cirurgia Cervico-Facial na Unicamp, também tendo feito fellowship em Rinologia e Cirurgia da Base do Crânio na instituição. Mestrado em Ciências da Cirurgia na Unicamp.
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