Já falamos anteriormente aqui no blog sobre emergências hipertensivas — e vale a pena conferir —, mas hoje vamos entrar um pouco mais a fundo em uma delas. Mais especificamente: a dissecção de aorta. Queremos te falar um pouco de tudo sobre essa emergência: classificação, quadro clínico, diagnóstico, tratamento — tudo! Dessa forma, você vai saber exatamente o que fazer quando se deparar com uma situação do tipo.
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Por definição, dissecção de aorta é uma delaminação da camada média dessa artéria, ocasionada pelo influxo de sangue através de um orifício de entrada na camada intima, como um rasgo, criando uma falsa luz no vaso.
Classificação de Stanford:
– Tipo A: Comprometimento da aorta ascendente (mais comum)
– Tipo B: Não compromete a aorta ascendente
Classificação de De Bakey:
– Tipo I: Dissecção da aorta ascendente, arco aórtico e aorta descendente
– Tipo II: Dissecção de aorta ascendente, somente
– Tipo III: Dissecção de aorta descendente
– IIIa: restrita a aorta descendente torácica
– IIIb: aorta descendente torácica e aorta abdominal
A classificação é importante para definição de conduta e prognóstico, como veremos mais a frente.
As principais patologias “culpadas” pela dissecção de aorta são a hipertensão arterial, que está relacionada em mais de 70% dos casos e as doenças do colágeno (síndrome de Marfan, Loeys-Dietz e Ehlers-Danlos).
O quadro clínico clássico é a dor torácica retroesternal de início agudo, de forte intensidade, com irradiação para as costas, algumas vezes irradiado para o abdome (principalmente se Stanford B), associado a sudorese, palidez cutânea e taquicardia.
A insuficiência aórtica é uma das principais causas de morte na dissecção de aorta, além do hemopericárdio com tamponamento cardíaco (lembrar da Tríade de Beck com hipotensão arterial, hipofonese de bulhas cardíacas e turgência jugular) e da ruptura da camada adventícia da aorta.
No exame físico temos alguns achados característicos, como o sopro de insuficiência aórtica (sopro diastólico em foco aórtico), a assimetria de pulsos (principalmente em membros superiores) e a diferença de pressão arterial entre os membros (normalmente maior que 20 mmHg). O déficit neurológico é algo de extrema importância, ou seja, toda vez que um paciente evoluir com dor torácica e déficit neurológico agudo o diagnóstico de dissecção de aorta tem que ser descartado.
Uma dica já dada na postagem de urgências e emergências hipertensivas e que novamente vamos comentar é a dor torácica com supradesnivelamento do segmento ST em parede inferior (DII, DIII e Avf) no ECG. Sempre que isso acontecer, o diagnóstico de dissecção de aorta tem que ser descartado através de sinais clínicos e se necessário com exames de imagem, pois caso o tratamento de infarto agudo do miocárdio com supradesnivelamento for realizado (AAS, Clopidogrel, anticoagulação plena e cateterismo/trombolítico) em um paciente com dissecção de aorta, provavelmente o paciente irá evoluir a óbito.
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Suspeitando do diagnóstico de dissecção de aorta através do quadro clínico e exame físico, podemos lançar mão de um score de alta sensibilidade para o diagnostico, o ADD-RS (Aortic Dissection Detection Risk Score):
O ECG e Rx tórax podem trazer sinais inespecíficos de dissecção de aorta, como sobrecarga de VE no Ecg mostrando HAS de longa data e alargamento de mediastino no Rx tórax.
O ecocardiograma transtorácico pode ser utilizado, porém tem baixa sensibilidade, sendo o ecocardiograma transesofágico melhor, muito útil em pacientes instáveis, porém com as desvantagens de não ser disponível com facilidade em alguns locais e de ser operador dependente.
A angiotomografia de tórax e abdome é amplamente disponível e o exame de escolha para os pacientes estáveis. A angiorressonância nuclear magnética é uma alternativa.
Após o diagnóstico, caso o paciente não esteja em sala de emergência, proceder com a monitorização continua, suporte ventilatório se houver necessidade e solicitar a punção de acesso venoso. A solicitação de vaga de UTI deve ser imediata.
O objetivo primário do tratamento da dissecção de aorta é o controle da frequência cardíaca (objetivar manter menor 60 bpm), da pressão arterial (objetivar manter Pas entre 100 – 120 mmHg) e da dor.
O esmolol é uma ótima opção pois diminui a frequência cardíaca e a pressão arterial, porém na prática é uma droga pouco disponível, assim como o labetalol. No dia a dia dos serviços de emergência do Brasil as primeiras opções serão o metoprolol (beta bloqueador endovenoso) associado a um vasodilatador endovenoso (nitroprussiato de sódio). Deve-se realizar primeiro o beta bloqueador e depois o vasodilatador endovenoso, pois uma vasodilatação periférica pode provocar aumento da frequência cardíaca, piorando o quadro.
O metoprolol (ampola de 5 mg) deve ser realizado em 5 minutos (1 mg por minuto) até alcançar o objetivo de 60 bpm ou por no máximo 3 vezes, com a introdução de um beta bloqueador oral após. Inicia-se logo em seguida um vasodilatador endovenoso, normalmente o nitroprussiato de sódio, objetivando a Pas < 120 mmHg. O controle da dor é de extrema importância pois ela pode elevar a frequência cardíaca e a pressão arterial, e para o seu controle deve-se utilizar a morfina.
O tratamento da dissecção de aorta Stanford A é primariamente cirúrgico e de urgência, com a equipe de cirurgia cardíaca sendo acionada imediatamente após o diagnóstico. Na dissecção de aorta Stanford B, a equipe de cirurgia vascular deve ser acionada, porém a cirurgia de urgência é reservada para os casos com complicação, como ruptura, disfunção renal, obstrução vascular, etc, sendo o tratamento medicamentoso o de escolha em casos não complicados. A cirurgia endovascular tem ganhado espaço em relação a cirurgia aberta.
Pronto! Agora você sabe como manejar corretamente — e bem — uma das mais complicadas patologias do setor de emergência, a dissecção de aorta. Mesmo assim, leia e releia sempre que necessário, com atenção, para que tudo ocorra da maneira mais tranquila possível quando for a sua vez de tratar esses pacientes.
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Bons estudos e até a próxima!
Nascido em 1993, formado pela Universidade de Santo Amaro (Unisa). Residência em Clínica Médica da Santa Casa de São Paulo. Apaixonado por Emergências clínicas, pelo aprendizado e pelo ensino.
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