Endocardite Bacteriana: novos Critérios de Duke 2023

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Fala, pessoal! Vamos conversar sobre um assunto que acabou de sair do forno: foram atualizados os Critérios de Duke para diagnóstico de Endocardite Infecciosa (EI), o chamado Critérios Duke-ISCVID 2023. 

A EI nada mais é do que infecção da superfície endocárdica do coração, acometendo principalmente as valvas cardíacas. Vale lembrar que essa doença é uma das infecções de maior mortalidade no mundo e muitas vezes subdiagnosticada.

A endocardite pode ser classificada como aguda ou subaguda a depender da evolução dos sintomas. Essa classificação não é definidora de tratamento, mas somente classifica os pacientes pelo tempo de sintomas. 

A sua principal etiologia é bacteriana e geralmente acomete mais pacientes do sexo masculino. As valvas mais acometidas são a mitral e aórtica. 

Pela pouca especificidade dos sintomas, devemos lembrar que todo paciente com febre e portador de fatores de risco deve ser investigado para endocardite. 

Os critérios de Duke

Utilizamos os critérios de Duke para diagnóstico de endocardite infecciosa com base em critérios ecocardiográficos, biológicos, clínicos, hemoculturas e sorologias. Foram originalmente publicados em 1994 e os modificados tiveram sua última atualização em 2000. 

Porém, desde 2015 a Sociedade Europeia de Cardiologia já vinha propondo atualizações dos critérios e, em 2021, já começaram a ser avaliadas as possíveis mudanças para 2023. 

Um dos maiores destaques foi a inclusão de dispositivos cardíacos permanentes (CDI e marcapasso definitivo) como fator de risco para EI, já que estes estão presentes em > 10% das EI confirmadas. 

Além disso, outro fato interessante foi a constatação de que os implantes de valva transcateter (a famosa TAVI) possuem risco de infecção semelhante aos implantes valvares cirúrgicos tradicionais, aumentando risco de EI associada à prótese.

Classicamente, utilizamos os critérios de Duke modificado, em que conforme os critérios clínicos, laboratoriais e de imagem podemos classificar o diagnóstico de endocardite de 3 formas:

EI definida — presença de 2 critérios maiores ou 1 maior e 3 menores ou 5 menores. 

EI possível — 1 maior e 1 menor ou 3 menores. 

EI descartada — outro diagnóstico possível é a resolução dos sintomas com uso de antibiótico por tempo menor ou igual a 4 dias e a ausência de evidência histopatológica durante cirurgia ou autópsia ou ainda não preencher critérios para as demais definições. 

Atualização 2023

Então, vamos ver o que mudou nos critérios de Duke em 2023 e como eles ficaram? Confira com a gente!

Critérios Maiores
Como eraComo ficou
Microbiológicos (hemoculturas de germes típicos e germes. isolados que podem causar EI)Evidência de envolvimento cardíaco nos exames de imagem.Removidos tempos > 12h e sítios de coletas distintos de hemoculturasAdiciona critério cirúrgico  (evidência perioperatória de vegetação)TC Cardíaca com achados similares ao ecocardiograma para diagnósticoPET/TC FDG : atividade metabólica anormal em valva nativa ou em implante valvar/dispositivos/outras próteses (percebam: não limita o tempo de implante e considera valva nativa)
Critérios Menores
Como eraComo ficou
Clínicos: predisposição, febre, vasculares, imunológicos, microbiológicoPredisposição: adicionado EI prévia e evidência de EI endovascular  (reparo/implante transcateter, dispositivos cardíacos permanentes CDI e marcapasso definitivo-)Vasculares: inclusão de abscesso esplênico e cerebralImunológicos: inclusão glomerulonefrite mediada por imunocomplexosMicrobiológico: inclusão de culturas com novos métodos de detecçãoAdicionado critério clínico: sopro novo se ecocardiograma indisponívelAdicionado PET/TC FDG : alteração de atividade metabólica < 3 meses do procedimento cardíaco (prótese valvar/aórtica, dispositivos intracardíacos  e outras próteses)
Germes típicos
Como eraComo ficou
S. viridans, S. bovis, grupo HACEK, S. aureus ou enterococos da comunidade sem evidência de outro foco Incluídos novos microorganismos típicos: E.faecalis, S.lugdunensis, Granulicatella spp, Gemella spp, Abiotrophia spp e todos os estreptococcos, exceto S. pneumoniae e S.pyogenes.Considerar típicos nos pacientes com próteses intracardíacas: estafilococos coagulase negativos, Serratia marcescens, Pseudomonas aeruginosa, Candida spp…

Para deixar organizado, vamos olhar agora os critérios de Duke na íntegra atualizados em 2023: 

Critérios maiores

  1. Microbiológicos:
  • Hemoculturas positivas para microrganismos típicos de EI (por exemplo, estreptococos viridans, Staphylococcus aureus) isolados de duas ou mais hemoculturas.
  • Hemoculturas positivas para germes que raramente causam EI, isolados em três ou mais hemoculturas.
  1. Testes laboratoriais positivos:
  • PCR para Coxiella burnetii, Bartonella sp, ou Tropheryma whipplei; ou anticorpos/IF para Bartonella.
  1. Imagem positiva para EI:
  • Evidência de envolvimento valvar em exames de imagem (ecocardiograma transtorácico ou transesofágico, tomografia computadorizada cardíaca ou FDG PET/CT). Inclui nova regurgitação ao ecocardiograma (mudança de sopro pré-existente não é suficiente)
  1. Critério cirúrgico:
  • Evidência de EI documentada à inspeção direta intraoperatória dispensam critérios de imagem ou microbiológicos

Critérios menores

Predisposição: 

  • história prévia de endocardite, intervenção valvar prévia, doença congênita, cardiopatia hipertrófica.

Febre ≥38°C.

Fenômenos vasculares: 

  • embolia arterial, aneurisma micótico, hemorragia conjuntival, lesões de Janeway, abcesso esplênico.

Fenômenos imunológicos: 

  • glomerulonefrite, nódulos de Osler, fator reumatoide positivo.

Fenômenos microbiológicos: 

  • evidência microbiológica não satisfazendo critério maior ou sorologia positiva para organismos conhecidos por causar EI (inclui PCR ou amplicon/sequenciamento metagenômico de patógeno atípico)

Imagem

  • Atividade metabólica anormal detectada por [18F]FDG PET/CT dentro de 3 meses após o implante da prótese valvar, enxerto aórtico ascendente, eletrodos de dispositivo intracardíaco ou outro material protético.

Definições de EI pelos Critérios de Duke 2023

Agora que já sabemos os novos critérios de Duke, precisamos definir se a EI é definitiva, provável ou descartada. 

EI Definida é estabelecida na presença de qualquer um dos seguintes:
Critério Patológico *
LESÕES PATOLÓGICAS – Vegetação ou abscesso intracardíaco demonstrando endocardite ativa na histologia, OU 
MICROORGANISMO – Demonstrado em cultura ou histologia de vegetação ou abscesso intracardíaco 
Critério Clínico
2 critérios clínicos maiores, OU
1 maior + 3 critérios clínicos menores, OU
5 critérios clínicos menores
EI Provável
1 critério maior + 1 menor, OU
3 critérios menores
EI Descartada ou Rejeitada
Diagnóstico diferencial alternativo consistente que explique os sinais/sintomas, OU
Resolução das manifestações clínicas ocorridas apesar de terapia com antibiótico por ≤ 4 dias, OU
Ausência de evidência patológica ou macroscópica de endocardite infecciosa em cirurgia, ou autópsia, com terapia antibiótica por menos de 4 dias.
Não atende aos critérios para endocardite possível acima.

Critérios patológicos

Microorganismos identificados no contexto de sinais clínicos de endocardite ativa em uma vegetação; de tecido cardíaco; de uma prótese valvar explantada ou anel de sutura; de um enxerto de aorta ascendente (com envolvimento da valva aórtica); de um dispositivo eletrônico implantável intracardíaco endovascular; ou de uma embolia arterial. 

Endocardite ativa (aguda, subaguda ou crônica) identificada em ou sobre uma vegetação; de tecido cardíaco; de uma prótese valvar explantada ou anel de sutura; de um enxerto de aorta ascendente (com evidência concomitante de envolvimento da válvula); de um dispositivo implantável intracardíaco endovascular; ou de um êmbolo.

Essas foram as atualizações da endocardite infecciosa!

Ou seja, pessoal, percebemos que os Critérios Duke-ISCVID de 2023 trouxeram a expansão das evidências microbiológicas, integração de novas modalidades de imagem, inclusão de infecções de válvulas protéticas, incorporação de biomarcadores para acompanhamento de tratamento (proteína C reativa e procalcitonina) e foi adicionado critério cirúrgico com a presença de inspeção peri operatória com evidência de EI, na tentativa de melhorar a acurácia diagnóstica e o tratamento da endocardite infecciosa.  

Referência

Fowler VG, Durack DT, Selton-Suty C, et al. The 2023 Duke-ISCVID Criteria for Infective Endocarditis: Updating the Modified Duke Criteria. Clin Infect Dis. 2023 May 4:ciad271. doi: 10.1093/cid/ciad271. Epub ahead of print. 

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BeatrizVilaça

Beatriz Vilaça

Sou uma médica com muito interesse em pesquisa, extensão e ensino. Residência em Clínica Médica pela Faculdade de Ciências Médicas da UNICAMP e formada em Medicina pela Universidade Federal do Paraná. Já fui bolsista CAPES pelo programa de intercâmbios Ciências Sem Fronteiras, de 2015-2016, e cursei Medicina na "Università Degli Studi di Roma La Sapienza", em Roma, Itália. Muito feliz em fazer parte da equipe Medway!