Se você faz plantão em uma maternidade, é importante dominar os diversos assuntos de neo. Um deles é a hipoglicemia neonatal. Provavelmente, você já passou pela situação de atender a um bebê apresentando glicemia 30 mg/dL e tremores.
O que fazer diante desse quadro: estimular o aleitamento materno, fazer uma correção venosa ou solicitar uma nova dosagem? Para tirar essa e outras dúvidas gerais, é preciso compreender o que é hipoglicemia neonatal e como desenvolver o tratamento.
A hipoglicemia neonatal é o distúrbio metabólico mais comum nessa faixa etária, um evento difícil de manejar, visto que nem as próprias referências sobre o tema entram em consenso.
Existem referências que usam o valor total no sangue, o valor no plasma, o tempo de vida do recém-nascido, os sintomas, entre outros fatores. Portanto, vamos nos basear nas principais.
Segundo a Associação Americana de Pediatria e a Sociedade de Endocrinologia Pediátrica, a definição varia conforme a presença, ou não, de sintomas e tempo de vida do bebê. Os valores mínimos de corte estão na tabela abaixo.
RN sintomáticos | RN assintomáticos | |
< 4h de vida | < 40 mg/dL | < 25 mg/dL |
4-24h de vida | < 35 mg/dL | |
24-48h de vida | < 50 mg/dL | < 50 mg/dL |
> 48h de vida | < 60 mg/dL | < 60 mg/dL |
Os quadros da doença acontecem em pacientes que podem ser divididos em três grandes grupos de fatores de risco:
A hipoglicemia neonatal secundária ao hiperinsulinismo ocorre em RN com mães diabéticas, RN GIG e RN macrossômicos. Isso porque eles têm um aumento no uso das reservas energéticas causado pelo excesso de insulina.
Os recém-nascidos com baixa reserva são aqueles PIG e prematuros, que devido ao baixo estoque de glicogênio, tendem a esgotá-lo mais rapidamente. Assim, desencadeiam o quadro da hipoglicemia neonatal.
Já nas causas mistas, enquadram-se a policitemia e o uso de determinadas medicações pela mãe do bebê portador. Alguns exemplos de remédios são betabloqueadores e beta-agonistas.
Na maioria dos casos, os pacientes são completamente assintomáticos. Porém, caso haja alguma manifestação clínica, ela pode surgir de maneiras diversas, como apneia, tremores, hipotonia, sucção débil e, nos piores casos, até crises convulsivas.
Como tudo na neonatologia, o segredo é a antecipação. Antes mesmo de o bebê apresentar qualquer sintoma, o tratamento deve ser iniciado baseado em uma triagem e nos valores da tabela vista anteriormente. A triagem não é indicada para todos os bebês de forma indiscriminada.
Ela é feita pela aferição da glicemia capilar, com o uso de um glicosímetro, sempre em horários pré-definidos. O ideal é que seja iniciada após a primeira mamada, que geralmente vai ocorrer na própria sala de parto durante a primeira hora de vida.
A partir daí, a periodicidade é estabelecida, e as medidas continuam a cada 3h ou 6h até 48h de vida. Uma vez que o valor da glicemia capilar esteja abaixo do ideal, é importante confirmar com a glicemia sérica, pois a sensibilidade dos glicosímetros não é boa para valores muito baixos.
A punção no calcanhar de forma periódica até 48h de vida só será necessária para aqueles pertencentes ao grupo de risco. Ou seja, RN PIG, GIG, macrossômicos, com mãe diabética, prematuros, policitêmicos e em casos específicos de uso de medicações por parte da mãe.
Todos os casos devem ser tratados independentemente de sintomatologia ou não. Isso é necessário por ser uma condição potencialmente grave e, muitas vezes, silenciosa.
O tratamento da hipoglicemia neonatal deve ser baseado nos valores anteriores de corte. Segundo a Associação Americana de Pediatria, ele é feito de formas distintas em pacientes sintomáticos e assintomáticos.
Todos os recém-nascidos sintomáticos devem receber reposição de glicose por via endovenosa, responsável por uma correção mais rápida. Inicie com 200 mg/kg em bolus e deixe a infusão contínua em soro de manutenção até estabilizar a glicemia. Ao mesmo tempo, a dosagem deve ser feita a cada hora até a normalização.
Nos assintomáticos com hipoglicemia confirmada, é indicada a correção via enteral. Cabe ao médico escolher entre estimular o aleitamento materno ou usar fórmula láctea. É importante aplicar uma nova medida 1h após a alimentação para checar se normalizou e mantê-la de forma contínua até às 48h completas de vida.
Caso o recém-nascido com menos de 4h mantenha glicemia menor ou igual a 25 mg/dL por 1 hora após alimentação, entre com a correção venosa, pois o que foi ingerido não foi suficiente para revertê-la. Nesse paciente, o procedimento é igual ao do sintomático: bolus de glicose EV seguido de soro de manutenção.
Naqueles cuja medida esteja em 25-40 mg/dL, cada médico escolhe entre corrigir de forma venosa ou tentar novamente via enteral. Para os maiores de 4h de vida, o bolus é indicado caso a glicemia se mantenha menor que 35 mg/dL 1h após a correção. Diante desses pacientes, pode haver uma nova tentativa de administração via oral se a glicemia estiver entre 35-45 mg/dL.
Como última tentativa, nas situações de hipoglicemia neonatal refratária, a solução pode ser administrar algumas medicações hiperglicemiantes, como glucagon e hidrocortisona. Não esqueça de que, nesses casos, é importante investigar outras possíveis causas, além das mencionadas.
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Carioca, nascida na cidade do Rio de Janeiro em 1989, formada pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) em 2014. Pediatra pelo Hospital Municipal Souza Aguiar (concluído em 2017) e Neonatologista pela Unicamp (concluído em 2020). Só com a educação construiremos um futuro melhor.