Fala, galera! Hoje vamos falar de uma doença que é rara no Brasil, mas comum na América do Norte. Por isso mesmo, de vez em quando, ela aparece na mídia (inclusive, alguns famosos, como Justin Bieber, Avril Lavigne e Alec Baldwin revelaram que já tiveram a doença!) e você já deve ter ouvido esse nome alguma vez… mas talvez não saiba ainda do que se trata! Então agora é a hora de desvendar essa tal de doença de Lyme.
A doença é causada por uma espiroqueta, a Borreliella, com ao menos três espécies patogênicas de distribuição na América do Norte e Europa, principalmente, sendo a espécie mais comum a Borrelia burgdorferi.
A transmissão ocorre por um vetor, o carrapato do gênero Ixodes, também conhecido como carrapato estrela. Ele é hiperendêmico em algumas regiões dos Estados Unidos e isso explica a alta incidência de casos por lá, bem como a relação com ambientes rurais, trilhas… Além disso, esses carrapatos se alimentam de animais maiores, principalmente cervos – que são típicos dos filmes americanos, mas não muito da nossa paisagem tropical.
A primeira descrição da doença de Lyme foi em Connecticut em 1977 após um surto de artrite em crianças (que acreditavam ser artrite reumatoide juvenil). Após estudo dos casos, concluiu-se que existem três fases da doença:
Figura 1. Eritema migrans – https://www.selecoes.com.br/saude/doenca-de-lyme-o-que-e-e-como-evita-la/
o Cardíaco: acometimento cardíaco é raro, mas pode se manifestar como bloqueio AV, cardiomiopatia leve e até miopericardite
o Neurológico: acomete o sistema nervoso central em até 15% dos indivíduos não tratados! As manifestações vão de meningite a neuropatia craniana e periférica e, raramente, mielite ou encefalite
o Musculoesquelético: manifestação bem comum, a artralgia aparece em até 60% dos pacientes e é tipicamente migratória
o Ocular: pode causar amplo espectro de manifestações oftalmológicas, como conjuntivite, irite, retinite e coroidite.
Nas fases iniciais da doença podem ocorrer manifestações iniciais inespecíficas, como aumento de provas inflamatórias (VHS e PCR), aumento de CPK, leucopenia, anemia, trombocitopenia e aumento de transaminases.
O diagnóstico etiológico depende da fase da doença. Na fase inicial, na presença do eritema migrans típico e epidemiologia positiva, o tratamento pode ser, inclusive, empírico. Para confirmação nesse estágio, pode ser feita biópsia da lesão com PCR da bactéria no material. Já na doença disseminada precoce e tardia, os testes sorológicos ganham espaço, sendo o ELISA e o Western blot os mais indicados.
A primeira informação que você deve ter em mente é que todos os pacientes com eritema migrans devem ser tratados para a doença de Lyme. O uso de antibioticoterapia é capaz de encurtar a duração dos sintomas e reduzir a progressão para forma disseminada e crônica. Os regimes preferidos são:
Para as formas disseminadas leves, o tratamento pode ser o mesmo do eritema migrans. No entanto, na presença de sintomas neurológicos (como meningite), cardite ou artrite grave, a preferência é por regime endovenoso:
Para os pacientes que cronificam, a terapia adjuvante com anti-inflamatórios não esteroidais é útil no controle álgico durante as crises de artrite. Além, é claro, da antibioticoterapia.
Pessoal, a doença de Lyme pode não ser tão comum na nossa prática mas, se aparecer, precisa ser identificada e tratada prontamente, já que reduz a chance de cronificar. A doença tardia compromete muito a qualidade de vida do indivíduo e o controle da doença é bem mais complicado. Por isso, volte naquela foto do eritema migrans: viu algo parecido, suspeite!
Além disso, sempre lembre da epidemiologia: viagens aos Estados Unidos ou Europa recente, trilhas, contato com meio rural e carrapatos fazem parte da história e corroboram a suspeita. Fora da prática clínica, as bancas das provas de residência têm uma certa obsessão por Lyme e não é raro cair, inclusive com presença de imagem (mais um motivo para voltar nela)!
E aí, curtiu? O foco aqui não é você sair um especialista em Borrelia, mas sim desmistificar um pouco a doença e, principalmente, saber quando suspeitar! É bem menos complicado do que parece!
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Referência Bibliográficas:
1. Uptodate: Epidemiology of Lyme disease
2. Uptodate: Clinical manifestations of Lyme disease in adults
3. Uptodate: Diagnosis of Lyme disease
4. Uptodate: Treatment of Lyme disease
5. Shapiro ED. Lyme Disease. N Engl J Med. 2014
Capixaba de Vitória, nascida em 1995. Formada pela Escola de Medicina da Santa Casa de Misericória (EMESCAM) de Vitória em 2018. Formada em Clínica Médica pelo HC FMUSP de São Paulo.