As síndromes clínicas de AVC são um grupo de sinais e sintomas característicos de um território arterial específico. É um tema muito abordado para provas de residência e que gera muitas dúvidas tanto nas provas como na prática clínica. Se você trabalha em emergência, certamente já atendeu um paciente com AVC agudo. E aí, você tem segurança em dizer qual o território arterial acometido responsável pela síndrome clínica do AVC? Se você se sente inseguro sobre esse tema, se liga nas dicas desse artigo!
Vamos dar um exemplo: chega no PS uma paciente de 70 anos, com história de hipertensão, dislipidemia e fibrilação atrial que apresentou subitamente um quadro de hemiparesia direita de predomínio crural e apatia. E aí, você sabe dizer qual síndrome clínica de AVC é essa? Sabe topografar a lesão? Se você tem essas ou outras dúvidas sobre as síndromes clínicas de AVC, segue o fio nesse artigo agora mesmo!
Obs: se você tem dúvida sobre trombólise, dê uma olhada no nosso artigo específico sobre esse tema.
As síndromes clínicas de AVC compreendem um tema muito interessante, pois alia a neuroanatomia e os territórios de irrigação arterial às manifestações clínicas de um insulto neurovascular. Sendo assim, vamos começar com os territórios arteriais do encéfalo.
Para conseguir topografar a lesão e entender as síndromes clínicas de AVC, vocês precisam saber quais são os territórios arteriais do encéfalo. A vascularização do encéfalo é dividida em ANTERIOR e POSTERIOR. A circulação anterior corresponde ao território carotídeo (ou seja, suprido pelas artérias carótidas), e tem como principais representantes as artérias cerebrais médias e cerebrais anteriores. A circulação posterior corresponde ao território vértebro-basilar (ou seja, suprido pelas artérias vertebrais e pela artéria basilar), e tem como principais representantes as artérias vertebrais, a artéria basilar e as artérias cerebrais posteriores. As síndromes clínicas de AVC de cada uma dessas artérias é diferente, já que cada uma irriga um território diferente do encéfalo.
A circulação carotídea irriga uma extensa área do encéfalo, que inclui o território da artéria cerebral anterior e da artéria cerebral média. Já a circulação vértebro-basilar irriga os lobos occipitais, o tronco encefálico e o cerebelo, representados conforme a figura abaixo:
imagem. Fonte: equipe Medway. Legenda: visão lateral do encéfalo com os respectivos territórios de irrigação arterial. Note como a circulação anterior é responsável pela irrigação da maior parte do cérebro e que a circulação posterior é responsável pelo suprimento sanguíneo de toda fossa posterior (que contém o tronco encefálico e o cerebelo). Sabendo disso, fica muito mais fácil entender as síndromes clínicas de AVC.
Para consolidar o conhecimento sobre as síndromes clínicas de AVC, vale entendermos a relação da vascularização cerebral com o homúnculo de Penfield. Lembram o que é isso? É a representação do que o nosso corpo tem no córtex cerebral. Dá uma olhada na figura para entender melhor a relação da vascularização com as síndromes clínicas de AVC:
Imagens. Fonte: equipe Medway. Legenda: A. Visão coronal do cérebro demonstrando as artérias responsáveis pelo suprimento sanguíneo de cada região cerebral. B. Homúnculo de Penfield – perceba a relação da representação do membro superior e da face com o território vascularizado pela artéria cerebral média, e perceba também a relação da representação do membro inferior com o território vascularizado pela artéria cerebral anterior.
Antes de detalhar as síndromes de AVC, é sempre importante lembrar que saber desconfiar de um AVC é fundamental, afinal, é uma doença muito comum de surgir no PS. Sabemos que o manejo desses pacientes com AVC não é fácil e, principalmente por ser uma corrida contra o tempo, não diagnosticá-lo pode alterar completamente a vida do doente. No nosso e-book gratuito AVC: do diagnóstico ao tratamento, te ensinamos o manejo do AVC, desde o primeiro contato com o paciente até a alta hospitalar. Informação nunca é demais, então que tal dar uma olhada lá também? Clique AQUI e baixe gratuitamente!
Hemiparesia e hipoestesia de predomínio braquiofacial (pior na face e no braço) contralaterais + afasia ou síndrome de heminegligência (afasia se lesão à esquerda e síndrome de heminegligência se lesão à direita). Obs: não se assuste se o examinador disser que há hemianopsia contralateral, pois isso pode ocorrer nos AVCs de ACM.
Imagem. Fonte: Hal Blumenfeld, 2a edição, página 243. Legenda: padrão de déficit motor e sensitivo (representado em roxo) em pacientes com lesão no território da ACM. Lembre-se de que o acometimento de membro inferior é menos intenso do que o acometimento do membro superior e da face.
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Monoparesia e hipoestesia de predomínio crural (pior no membro inferior) contralaterais. Ou seja, fraqueza e hipoestesia da PERNA contralateral. Além disso, por acometer o lobo frontal, esses pacientes podem apresentar alterações cognitivas, especialmente APATIA e PERDA DE INICIATIVA, também chamada de ABULIA.
Imagem. Fonte: Hal Blumenfeld, 2a edição, página 245. Legenda: padrão de déficit motor e sensitivo (representado em roxo) em pacientes com lesão do território da ACA.
Hemianopsia homônima contralateral. Ora, essa artéria é responsável pela irrigação dos lobos occipitais, onde se encontra a representação cerebral dos campos visuais. Segue uma imagem de como ficaria o campo visual de um paciente com AVC de ACP direita:
OLHO ESQUERDO | OLHO DIREITO |
Imagem. Fonte: Hal Blumenfeld, 2a edição, página 474. Legenda: hemianopsia homônima esquerda (déficit de campos visuais representado em roxo). É o déficit esperado em AVC de ACP.
Múltiplos sintomas de tronco e cerebelo são possíveis. O que te ajuda a topografar nesse território, em prova, serão náuseas, vômitos, disartria grave, disfagia, diplopia, ataxia, nistagmo, desalinhamento ocular, tetraparesia, síndrome de Horner e, especialmente, SÍNDROMES ALTERNAS (síndromes clínicas de AVC peculiares, em que um nervo craniano é acometido de um lado e hemicorpo acometido é acometido do outro). Vai um exemplo abaixo de um AVC de tronco encefálico (especificamente da ponte), com paralisia facial periférica ipsilateral à lesão e hemiparesia contralateral:
Imagem. Fonte: Hal Blumenfeld, 2a edição, página 244. Legenda: síndrome alterna por lesão pontina, com fraqueza contralateral e paralisia facial periférica ipsilateral (pode ser chamada de síndrome de Foville ou Millard-Gubler).
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Paranaense nascido em 1990. Formado pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR) de Curitiba em 2014. Residência em Neurologia pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Palo (HCFM-USP), concluída em 2019. No HCFM-USP, experiência como preceptor dos residentes entre 2019-2020. Concluiu um fellowship em Neuroimunologia em 2021. Experiência como médico assistente do departamento de Neuropsiquiatria do Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná (HC-UFPR). "As doenças são da antiguidade e nada se altera sobre elas. Somos nós que mudamos na medida em que estudamos e aprendemos a reconhecer o que antes era imperceptível."