Fala, pessoal, tudo tranquilo? Imagina que você está chegando ao seu primeiro plantão, uma semana depois da sua formatura, e o seu paciente tem uma taquicardia supraventricular. E aí? Você sabe identificá-la no eletrocardiograma? Sabe o que fazer nessa situação? Deve ser feita uma cardioversão, valsalva ou adenosina?
Ah, e nós temos uma dica para você. Como está a sua interpretação de eletrocardiogramas? Seja para compreender imagens em uma prova de residência ou mesmo para o diagnóstico, todo mundo sabe que ela é fundamental. Então, que tal aprimorar o seu conhecimento sobre ECG com o curso da Medway?
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Agora, calma parceiro, respira, estamos aqui para te ajudar e vamos juntos formar uma linha de raciocínio, bora?
Quando entendemos aquilo que estamos estudando, conseguimos consolidar o conhecimento. Mas, se apenas decoramos, na semana seguinte já não nos lembramos de mais nada. Por isso, não pule diretamente para o tratamento! Antes entenda comigo o que é uma taquicardia supraventricular.
Primeiramente, vamos analisar o conceito dos termos. Taquicardia significa que o coração está muito acelerado, isto é, com frequência maior que 100 bpm. Já o termo supraventricular revela que a causa — ou melhor, o “disparo” do estímulo elétrico — ocorre antes do feixe de His.
Tendo isso em mente, podemos concluir que existem vários tipos de taquicardias supraventriculares, inclusive a taquicardia sinusal e a fibrilação atrial. Mas, popularmente, quando falamos em taquicardia supraventricular, ou “taqui supra” para os mais íntimos, na realidade estamos falando sobre taquicardia por reentrada nodal. E aqui, neste texto, também me refiro a esta especificamente.
Essa arritmia ocorre devido à existência de duas vias de condução elétrica no nó AV: uma rápida com período refratário longo e outra lenta com período refratário curto. Falei grego? Deixa eu explicar tudo com detalhes. Período refratário é basicamente o tempo em que as células estão “atordoadas” e não conseguem deixar um novo estímulo passar.
O mecanismo de reentrada ocorre normalmente após uma contração atrial prematura, que é a despolarização atrial antes do tempo habitual. Esse estímulo tenta passar pela via rápida, mas ela ainda está no período refratário da contração atrial anterior normal (1). Então, a outra opção será pegar a via lenta. O problema é que quando este estímulo chega no final do nó AV, o período refratário da via rápida já terminou e a corrente elétrica consegue subir para os átrios (2). Nesse momento, se cria um curto circuito (3), pois um estímulo desce para os ventrículos e outro sobe para os átrios.
Chegou a hora do terror dos recém formados, o eletrocardiograma. Relaxa, se você entendeu o parágrafo anterior, o entendimento deste será bem mais fácil.
Vou te entregar de bandeja os macetes para identificar uma taquicardia supraventricular no ECG e depois vou destrinchar cada alteração. Bora!
Aqui é fácil! Você já entendeu porque ocorre o “curto circuito” e sabe que a frequência cardíaca irá aumentar em decorrência disso. Caso você não lembre como se calcula a FC, anota aí:
FC = 1500 / n° quadrados pequenos (fórmula de cálculo da FC) |
No ECG acima podemos contar 8 quadrados pequenos entre duas ondas R, então a FC ≈ 180 bpm.
Como o estímulo elétrico é disparado acima do feixe de His, temos QRS estreito. Entenda uma coisa, o QRS é estreito porque a condução do estímulo é rápida pelo feixe de His. Quando o disparo é do ventrículo, por exemplo, a corrente elétrica passa de célula a célula, devagar, logo o QRS ficaria alargado.
Ritmo regular pessoal, entre uma onda R e outra temos sempre a mesma distância (no exemplo acima: 8 quadrados pequenos – 320 ms). Se for irregular pensaremos principalmente em fibrilação atrial.
Você já entendeu que a taquicardia supraventricular ocorre porque há um curto circuito na volta do nó AV. Então, pensa assim, não há um disparo saindo do nó sinusal (dos átrios para os ventrículos) e a contração atrial não ocorre antes da contração ventricular, na realidade, elas ocorrem quase que simultaneamente. Logo, a onda P fica “escondida” dentro do QRS ou se apresenta um pouco após como uma pseudo-s (D2) ou pseudo-r’ (V1).
Basicamente é um entalhe de polaridade negativa no final do QRS. Essa onda S é na realidade a representação da onda P (contração atrial), que ocorre no sentido contrário, já que o estímulo é de baixo para cima, e após o QRS, porque ocorre pouco depois da contração ventricular.
Mesma explicação da pseudo-s em D2, mas aqui como é em V1, o entalhe final do QRS é positivo, como uma onda r’, que também está representando a onda P.
Existe a possibilidade da taquicardia supraventricular se apresentar com o QRS alargado (quando existe via acessória — condução aberrante), sendo, nesses casos, muito semelhante a uma taquicardia ventricular (TV). Ao nos depararmos com uma taquicardia com QRS alargado e regular, temos que definir se é uma TV ou uma Taquicardia supraventricular com condução aberrante (TSV-A), para isso existe o famoso critério de Brugada. Calma, não precisa decorar todos critérios, basta saber o nome dele para pesquisar se for preciso.
Importante: na maioria desses casos é uma TV e uma TV é mais grave do que TSV-A. Então, meu amigo, até que se prove o contrário, pense que é TV!
Último detalhe, quer brilhar numa discussão de ECG sobre esse tema? Decora o critério de Wernicke: QRS positivo (para cima) em aVR = TV. Se liga, se for negativo pode ser tanto TV quanto TSV-A, nesse caso tem que recorrer à Brugada ou algum outro critério; mas, se for positivo, é uma TV e pronto, só correr para o abraço.
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A primeira tarefa, antes de qualquer coisa, é definir se há instabilidade.
Lembrando que não apenas na taquicardia supraventricular, mas sim em todas arritmias, essa definição é muito importante.
Vou repetir, pois isto define o lado do fluxograma que deve ser seguido. Avalie os critérios de instabilidade parceiro!
Critérios de instabilidade |
Hipotensão/choque |
Rebaixamento do nível de consciência |
Dor precordial |
Dispneia (insuficiência cardíaca/edema agudo de pulmão) |
Taquicardia supraventricular instável = Cardioversão elétrica IMEDIATA!
Beleza, estou de plantão e sei que devo fazer uma cardioversão elétrica. Mas como é que se faz isso? Acalma o coração que vamos te explicar. Basta seguir esse passo a passo:
Se quiser se aprofundar mais sobre o tema, clique aqui e confira este artigo que está sensacional.
Detalhe: podemos fazer adenosina antes da cardioversão elétrica. desde que não atrase a cardioversão! Então se o paciente tem acesso, a adenosina está em pronto emprego e a cardioversão não, pode fazer adenosina. Te explico como se faz daqui a pouco.
Nesse caso podemos iniciar o manejo com manobras vagais, como compressão do seio carotídeo (não esqueça de auscultar as carótidas em busca de sopro e de evitar em idosos), provocar vômito, tomar um copo de água gelada ou então a mais usada, Manobra de Valsalva (basta que o paciente sopre contra o dorso da mão, promovendo um aumento da pressão intra-abdominal, desencadeando o reflexo vagal). Bem simples, mas infelizmente a reversão ocorre apenas em cerca de 20% dos casos.
Podemos fazer também a Manobra de Valsalva modificada (com uma taxa de sucesso superior às demais: 43% das taquicardias supraventriculares foram revertidas de acordo com o estudo REVERT), segue o passo a passo:
Posição: Paciente sentado a 45º
1ª etapa: Assoprar uma seringa de 10ml durante 15 segundos
2ª etapa: Deitar e levantar as pernas, mantendo por 15 segundos
Vimos que isso é bem simples e, portanto, deve ser tentado sempre antes das medidas farmacológicas, no paciente ESTÁVEL.
Realizei a manobra, sem sucesso, o que fazer? ADENOSINA
A adenosina é uma medicação que age no nó AV interrompendo a condução do impulso elétrico, ou seja, faz um “reset” no coração. Por conta disso, ela pode causar mal estar, desconforto torácico e sensação de morte iminente. Não esqueça de comunicar isso para o paciente, você não quer que ele sinta que vai morrer sem saber que é apenas um efeito da medicação e depois vai passar, certo?
A dose é de 6 mg (1 ampola tem 2 ml e concentração de 3 mg/ml — logo, 1 ampola tem 6 mg) e a infusão tem que ser rápida e seguida de um bolus de 20 ml de soro fisiológico. Isso porque a meia-vida da adenosina é muito curta (segundos) e precisamos fazer com que ela chegue rapidamente ao coração. Caso não reverta, podemos repetir com uma dose de 12 mg (2 ampolas).
Para memorizar:
Sequência de tentativas na taquicardia supraventricular estável:
Aqui, pensaremos em outras causas de taquicardia supraventricular que não sejam pelo mecanismo de reentrada AV (pode ser por automatismo — taquicardia atrial, ou reentrada que não envolve o nó AV — fibrilação atrial / flutter atrial), sendo indicado controle da frequência cardíaca com drogas específicas.
Parabéns! Paciente com taquicardia supraventricular revertida e assintomático pode receber alta hospitalar com acompanhamento ambulatorial. Claro, sempre avaliar caso a caso né meu amigo?
Esperamos que você tenha esclarecido todas as suas dúvidas a respeito de taquicardia supraventricular!
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Gaúcho, de Pelotas, nascido em 1997 e graduado pela Universidade Federal de Pelotas (UFPEL). Residente de Clínica Médica na Escola Paulista de Medicina (UNIFESP). Filho de um médico e de uma professora, compartilha de ambas paixões: ser médico e ensinar.