Tomografia computadorizada da pelve: como interpretar

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Fala, pessoal, tudo em cima? Neste texto, vamos fazer um passo a passo para a interpretação de uma tomografia computadorizada da pelve. É hora de rever aspectos técnicos e anatômicos. Assim, você vai estar pronto para avaliar alterações nos exames de imagem que você solicitar ao seu paciente. E aí, bora?

A técnica da tomografia da pelve

Em geral, o estudo tomográfico das patologias abdominais deve, sempre que possível, incluir todo o abdome (abdome superior e pelve), já que a avaliação global do abdome é mais adequada. 

Como o exame de tomografia é super rápido, não faz sentido adquirir somente um segmento abdominal. Fragmentar o estudo tomográfico do abdome, adquirindo somente um segmento superior ou inferior, pode causar atrasos no diagnóstico e não traz muitos benefícios. 

Podemos dizer que essa regra, porém, já não vale para a ressonância (RM). Como o estudo de RM é demorado, cada sequência deve ser necessária e cuidadosamente escolhida. 

Sendo assim, não faz sentido aumentar em 30 min o tempo de exame para capturar imagens do fígado se a região de interesse do estudo de RM é a próstata, por exemplo. 

Na RM, vamos focar sempre no órgão de interesse, para que o exame não tenha uma duração muito longa, com aumento do seu custo. É claro que na medicina nada é absoluto. Em alguns casos específicos, obter cortes tomográficos apenas de um segmento (somente a pelve, por exemplo) pode ser super bem indicado. 

Um exemplo clássico são as crianças, já que tentaremos sempre evitar ou reduzir o uso de radiação. Sendo assim, se for possível irradiar apenas um segmento abdominal em que se tem mais interesse clínico, melhor. 

Outra situação que pode justificar a aquisição apenas da pelve acontece em prol do controle de patologias, que sabidamente estão restritas à pelve, como patologias da bexiga, por exemplo.

A tomografia da pelve em geral inclui cortes que vão desde o contorno inferior dos rins (estudados na tomografia de abdome superior) até a raiz das coxas. Os órgãos e estruturas abdominais incluídos são: 

  • bexiga;
  • ureteres distais;
  • genitália interna (útero e anexos na mulher, próstata e vesículas seminais no homem);
  • reto e segmento variável do sigmoide;
  • ceco;
  • apêndice (podem não ser incluídos totalmente em caso de variações anatômicas como ceco alto);
  • os vasos ilíacos,;
  • ossos da pelve e quadris;
  • regiões inguinais.

O exame deve, preferencialmente, ser adquirido com contraste endovenoso, porque a avaliação dos órgãos abdominais melhora muito quando é utilizado. Exceções a essa regra são os cálculos urinários. Dependendo da indicação, pode ser necessário mais de uma fase contrastada:

  • Fase sem contraste: cálculos urinários, calcificações, hematomas.
 Cálculo no interior da bexiga
Cálculo no interior da bexiga. Fonte: https://en.wikipedia.org/wiki/Bladder_stone
  • Fase arterial: avaliação das artérias ilíacas e outras artérias pélvicas, avaliação de sangramento ativo, pesquisa de lesões hipervascularizadas (tumores neuroendócrinos, por exemplo).
Artérias ilíacas e outros ramos arteriais mesentéricos. Note que na fase arterial do exame apenas as artérias estão contrastadas (brancas) enquanto as veias ainda não apresentam contraste em seu interior.
Artérias ilíacas e outros ramos arteriais mesentéricos. Note que na fase arterial do exame apenas as artérias estão contrastadas (brancas) enquanto as veias ainda não apresentam contraste em seu interior. Fonte: http://www.meddean.luc.edu/lumen/meded/radio/curriculum/gi/Iliac_artery3.htm
  • Fase portal (venosa): avaliação das veias ilíacas e das outras veias pélvicas, avaliação de coleções, avaliação das paredes vesicais e das alças intestinais, avaliação de órgãos sólidos (útero e próstata, por exemplo), avaliação de massas pélvicas.
Tomografia computadorizada da pelve em fase portal mostrando espessamento difuso e irregular da bexiga e realce de suas paredes, sugestivo de neoplasia urotelial
Tomografia computadorizada da pelve em fase portal mostrando espessamento difuso e irregular da bexiga e realce de suas paredes, sugestivo de neoplasia urotelial. Fonte: pahttps://www.scielo.br/j/ibju/a/BjB4FHns6KfpTV3QzrBZdhv/?lang=en
  • Fase tardia ou excretora: avaliação do urotélio dos ureteres distais e da bexiga, avaliação de fístulas urinárias.
Tomografia computadorizada da pelve em fase excretora tardia. O contraste já foi filtrado pelos rins e agora está sendo excretado na urina que aparece hiperatenuante (branca) preenchendo a bexiga. Note como esta fase torna fácil a detecção de lesões polipoides neoplásicas nas paredes da bexiga.
Tomografia computadorizada da pelve em fase excretora tardia. O contraste já foi filtrado pelos rins e agora está sendo excretado na urina que aparece hiperatenuante (branca) preenchendo a bexiga. Note como esta fase torna fácil a detecção de lesões polipoides neoplásicas nas paredes da bexiga. Fonte: https://www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S0169260722000207?via%3Dihub

Anatomia tomográfica da pelve

Começando pela bexiga: para que ela seja melhor avaliada nos exames de imagem, sempre que possível ela deve estar moderadamente cheia. Isso distende suas paredes, que ficam mais finas, retificadas e regulares, o que permite identificar espessamentos e irregularidades que surjam no processo inflamatório (cistite) ou tumores. 

Ela se localiza posterior à sínfise púbica e anterior ao reto no homem e ao útero e vagina nas mulheres. Devido ao seu conteúdo líquido (urina), que é hipoatenuante na tomografia, observamos uma estrutura arredondada, hipoatenuante, com paredes finas e regulares, que têm um discreto realce pelo contraste.

Bexiga normal na tomografia computadorizada da pelve:
Bexiga normal na tomografia computadorizada da pelve: Fonte: https://www.urologyannals.com/viewimage.asp?img=UrolAnn_2012_4_1_38_91622_u6.jpg

Os órgãos da genitália interna, tanto masculina quanto feminina, são apenas grosseiramente avaliados pela tomografia computadorizada. Este método tem resolução anatômica bem inferior à ressonância, que deve ser preferida sempre que possível. 

De maneira geral, conseguimos avaliar as dimensões da próstata, seus contornos e o realce parenquimatoso, mas raramente a tomografia tem sensibilidade suficiente para identificar nódulos, tumores prostáticos ou pequenos abscessos. 

A próstata aparece como uma imagem piriforme abaixo do assoalho vesical. As vesículas seminais ficam imediatamente posteriores, uma à direita e outra à esquerda. 

Aspecto tomográfico normal da próstata (número 1), imediatamente anterior ao reto (número 2), envolvida pelo músculo obturador interno (número 3) e posterior ao púbis (número 5).
Aspecto tomográfico normal da próstata (número 1), imediatamente anterior ao reto (número 2), envolvida pelo músculo obturador interno (número 3) e posterior ao púbis (número 5). Fonte: http://www.aboutcancer.com/ct_prostate.htm
Aspecto tomográfico normal das vesículas seminais (número 2), imediatamente posteriores à bexiga  (número 1) e anteriores ao reto (número 3). A artéria ilíaca externa  é marcada pelo número 4 e a veia pelo número 5.
Aspecto tomográfico normal das vesículas seminais (número 2), imediatamente posteriores à bexiga  (número 1) e anteriores ao reto (número 3). A artéria ilíaca externa  é marcada pelo número 4 e a veia pelo número 5. Fonte: http://www.aboutcancer.com/ct_prostate.htm

O útero e os anexos também não são muito bem avaliados pela tomografia (prefira a ultrassonografia pélvica ou a ressonância magnética). De maneira geral, conseguimos avaliar o volume uterino e seus contornos, bem como conseguimos identificar lesões anexiais císticas ou sólidas, apesar da dificuldade em caracterizá-las. 

O plano sagital é o melhor para avaliação do útero, já que, anatomicamente, ele fica melhor representado. Os anexos são facilmente identificados em mulheres na menacme, porque são grandes e os folículos aparecem como estruturas císticas. Já em crianças e pacientes menopausadas, as pequenas dimensões dos ovários geralmente tornam a sua localização difícil. 

Aspecto tomográfico normal do útero (U). A seta maior mostra o recesso vesicouterino (reflexão peritoneal entre a bexiga e o útero) e a cabeça de seta mostra o fundo de saco de Douglas.
Aspecto tomográfico normal do útero (U). A seta maior mostra o recesso vesicouterino (reflexão peritoneal entre a bexiga e o útero) e a cabeça de seta mostra o fundo de saco de Douglas. Fonte:https://radiologykey.com/computed-tomography-normal-anatomy-imaging-techniques-and-pitfalls/
Aspecto tomográfico normal dos ovários (setas) e do  útero (U). As cabeças de setas mostram os vasos ilíacos externos.
Aspecto tomográfico normal dos ovários (setas) e do útero (U). As cabeças de setas mostram os vasos ilíacos externos. Fonte:https://radiologykey.com/computed-tomography-normal-anatomy-imaging-techniques-and-pitfalls/

O reto e parte do sigmoide podem ser vistos na tomografia. São estruturas tubulares preenchidas por conteúdo heterogêneo, que são as fezes bem formadas. Podemos identificar áreas de espessamento parietal, principalmente inflamatório (retites, colites), bem como divertículos. 

Vale lembrar que estas estruturas são melhor avaliadas pela colonoscopia ou retossigmoidoscopia, mas a tomografia computadorizada pode fazer uma avaliação geral, principalmente em quadros mais agudos abdominais.

Aparência normal do reto na tomografia da pelve.
Aparência normal do reto na tomografia da pelve. Fonte: http://www.aboutcancer.com/colorectal_PET_CT.htm

Curtiu saber mais sobre a tomografia computadorizada da pelve? 

É isso, pessoal! Esperamos que tudo tenha ficado claro e que você tenha compreendido o conteúdo!

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LuisaLeitão

Luisa Leitão

Mineira, millennial e radiologista fanática. Formou-se em Radiologia pelo HCFMUSP na turma 2017-2020 e realizou fellow em Radiologia Torácica e Abdominal em 2020-2021 no mesmo instituto, além de ter sido preceptora da residência de Radiologia por 1 ano e meio. Apaixonada por pão de queijo, café e ensinar radiologia.