Tratamento da diabetes gestacional: saiba mais!

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Galera, a primeira coisa que precisamos fazer antes de pensar em iniciar o tratamento da diabetes gestacional com medicamentos é explicar para nossa gestante o diagnóstico e todos os possíveis impactos que ele pode causar! Lembrar que é uma condição assintomática e precisamos muito que ela esteja ciente e engajada a embarcar na jornada do tratamento! Como veremos adiante, tudo isso vai mudar a forma com que a gestante percebe a gravidez e seus hábitos!

O tratamento de mulheres com DMG diminui consideravelmente os eventos adversos perinatais. Só para vocês terem uma ideia, em 2009, um randomizado comparou 485 gestantes com DMG considerado leve, (GJ<  95 mg/dl ao diagnóstico), que receberam intervenção nutricional e, quando necessário, insulina, com 473 mulheres com DMG que não receberam intervenção.

Os autores encontraram reduções significativas com o tratamento, em comparação com os cuidados habituais, no peso médio ao nascer, tecido adiposo  neonatal, bebês  grandes para a idade gestacional ou macrossômicos, distocia de ombro e parto cesáreo. Além de ter sido verificado redução significativa na frequência de pré-eclâmpsia e hipertensão gestacional. Ou seja, devemos ficar muito atentos a essa gestante, pois qualquer descontrole pode gerar impacto negativo.

Toda paciente deve ser estimulada e orientada a realizar a automonitorização da glicemia capilar, por meio de glicosímetro, fita reagente e punção em ponta de dedo, a partir do momento do diagnóstico do DMG. Gestantes em tratamento não farmacológico devem fazer o perfil diariamente (ou pelo menos três vezes por semana), com quatro medidas (jejum, pós-café, pós-almoço e pós jantar), e para aquelas em uso de insulina, o controle deve ser diário. Para pacientes com diabetes tipo 1 ou tipo 2, o controle glicêmico inclui também medidas pré-prandiais. Em relação ao controle, os valores de referência para considerarmos o controle adequado são os seguinte:

  • Jejum: < 95 mg/dL;
  • Pré-refeições: < 100 mg/dL
  • 1 hora após as refeições: < 140 mg/dL; 
  • 2 horas após as refeições: < 120 mg/dL.

Quais são os tratamentos disponíveis para a diabetes gestacional?

A abordagem terapêutica de todas as gestantes com diabetes deve incluir orientação nutricional adequada e individualizada, e atividade física, na ausência de contra indicações obstétricas.

Quanto às orientações nutricionais, o Ministério da Saúde orienta que a distribuição de macronutrientes deve considerar 40% a 55% de carboidratos, 15% a 20% de proteínas e 30% a 40% de lipídios. Deve-se priorizar alimentos in natura, não processados e o açúcar pode ser substituído por edulcorantes, lembrando que aspartame, acesulfame de potássio, ciclamato, entre outros, podem ser usados na gestação.

Em relação à atividade física, as gestantes que já praticavam alguma atividade devem ser encorajadas a continuar, e para as sedentárias orienta-se início de caminhada de intensidade moderada, 5  vezes ou mais por semana, com duração média de 30/40 minutos. 

Beleza, e qual o tempo necessário para saber se essas mudanças surtiram o efeito desejado? Após 7 a 14 dias de perfil glicêmico a paciente deve retornar, e se percebermos 30% ou mais dos valores alterados temos a indicação de iniciar terapia medicamentosa. Outro critério que pode ser considerado é o crescimento fetal, independente dos valores de glicemia, quando encontramos uma circunferência abdominal ≥ ao P75 em uma ultrassonografia realizada entre a 29-33ª semana.

Qual terapia medicamentosa é indicada para a diabetes gestacional?

A primeira linha no tratamento da diabetes gestacional é a insulinoterapia, que possui eficácia e segurança comprovadas durante a gravidez, e que além disso, pelo tamanho da sua molécula tem passagem limitada pela placenta. Praticamente todos os tipos de insulina disponíveis no mercado podem ser prescritas, mas as mais utilizadas são a NPH (protamina neutra Hagedorn), que tem ação intermediária, e a regular, com ação rápida.

A dose inicial vai ser determinada pelo perfil glicêmico, e de uma maneira geral a NPH atuará no controle das glicemias de jejum e pré-prandial, e a regular, nas glicemias pós-prandiais. Os análogos de insulina de ação ultrarrápida (asparte e lispro) e de longa duração (detemir) também são liberados na gestação, mas tem indicação para casos específicos, como no DM tipo 1.

Com relação às doses, orienta-se, para o início do tratamento, a dose total de 0,5 U/kg/dia, dividida de acordo com os achados do perfil. O uso de insulinas intermediárias com insulinas rápidas são, sem dúvida, os mais fisiológicos, sendo administradas de quatro a 5 doses, devendo-se fazer insulina rápida nas refeições (café, almoço e jantar) e NPH à em jejum e à noite, mas o Ministério da Saúde sugere também o esquema fracionado de NPH em duas a três aplicações (Jejum, pré almoço e antes de dormir).

Além disso, se percebidas alterações específicas, podemos utilizar insulina direcionada apenas para esse momento, como por exemplo, se alteração apenas nos valores em jejum, utilizamos apenas NPH no período noturno (conhecida como bedtime). Os ajustes devem ser individualizados baseados no monitoramento diário da glicose a cada uma ou duas semanas.

Um assunto que tem despertado muito interesse e estudo, pela sua comodidade posológica e facilidade de aplicação, é o uso de hipoglicemiantes orais, como a metformina e glibenclamida. Atualmente não existem estudos que consigam garantir a segurança de seu uso durante a gestação, por ultrapassarem a barreira placentária, porém os estudos mostram que ambos são igualmente eficazes no controle glicêmico e, além disso, a metformina também reduz a incidência de hipertensão gestacional. São consideradas indicações para o seu uso:

  • Difícil acesso à insulina; 
  • Incapacidade para a autoadministração de insulina; 
  • Estresse exacerbado em decorrência do uso de insulina, com potencial restrição alimentar; 
  • Necessidade de altas doses diárias de insulina (>100 UI) sem resposta adequada no controle glicêmico.  

Quando indicar o parto? Qual a melhor via?

Aqui é necessário jogo de cintura! Precisamos andar na corda bamba em que de um lado temos os riscos do parto tardio atrelado à um crescimento fetal excessivo, com aumento nas taxas de tocotraumatismo e natimortalidade, e por outro temos os riscos da indução precoce, acompanhado da prematuridade e piora nos desfechos ventilatórios do RN. 

De maneira geral, nas gestantes que realizam apenas tratamento não farmacológico com controle adequado, não temos indicação de interrupção antecipada da gestação. Já nas que realizam tratamento medicamentoso ou que não atingem controle adequado, a antecipação do parto pode ser necessária. 

Em relação à via de parto, o diagnóstico isolado de DMG não constitui indicação de cesariana, a via será obstétrica, ou seja, priorizamos a via vaginal a não ser que tenhamos contraindicação à ela!

E durante o trabalho de parto? Muda alguma coisa?

Olha só, o momento que a mulher mais necessita de energia ao longo da gestação é no trabalho de parto, então o cuidado deve ser redobrado! Os níveis glicêmicos devem ser mantidos entre 100-120 mg/dL, e para isso a glicemia capilar deve ser realizada a cada 2 horas. Se constatada hipoglicemia (GC < 70 mg/dL), realizamos a infusão de glicose a 5-10% por via intravenosa; e se houver hiperglicemia, vamos utilizar a insulina regular para o seu manejo! 

Na cesárea programada, temos a recomendação de jejum mínimo de oito horas, então metade a um terço da dose diária de insulina NPH deve ser administrada na manhã do parto. Além disso, o controle da glicemia capilar deve ser feito a cada 2 horas, além de infusão contínua de glicose a 5%, na dose de 125 mg/h, por via intravenosa.

No caso de indução, na manhã de início deve ser realizado o desjejum, mas a dose de NPH deve ser readequada, da mesma forma que fazemos no caso de cesariana! O perfil glicêmico deve ser mantido e as correções realizadas com regular, até o início do trabalho de parto!

Como fica o puerpério?

Pronto, galera! Agora vocês já estão craques em manejar o DMG, mas o que vem depois? Na grande maioria das gestantes, após a dequitação placentária, temos a interrupção na produção e liberação dos hormônios diabetogênicos e o retorno aos níveis glicêmicos basais. Grande parte das pacientes em uso de insulina não necessitam de continuar o seu uso após o parto! A exceção são aquelas que faziam uso de doses elevadas ou com hiperglicemia persistente, que devem permanecer realizando o perfil glicêmico para a suspensão segura, por 24 a 72 horas após o parto

Vamos lembrar também que uma paciente com DMG têm maior risco de desenvolver no futuro DM2, ou ainda, permanecer diabética após a gestação. Nesse sentido, uma nova avaliação glicêmica após aproximadamente seis a oito semanas deve ser realizada. Vamos dar preferência ao TOTG 75 g, com medidas de jejum e duas horas. Os valores que definem diabetes são jejum ≥ 126 mg/dL ou duas horas ≥ 200 mg/ dL.

E aí, curtiu saber mais sobre o tratamento da diabetes gestacional?

Bom galera, trilhamos todos os aspectos do tratamento da diabetes gestacional e agora é a hora de vocês brilharem! Então, confira outros conteúdos que publicamos aqui no blog. Eles foram feitos especialmente para você mandar bem no seu plantão e vida profissional, além de ficar por dentro dos mais variados assuntos.

É isso galera, espero que tenha dado pra aprender um pouco mais sobre Medicina de Emergência! Caso queira estar completamente preparado para lidar com a sala de emergência, conheça o PSMedway. Por meio de aulas teóricas, interativas e simulações realísticas, ensinamos como conduzir as patologias mais graves no departamento de emergência.

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DanielGodoy Defavari

Daniel Godoy Defavari

Paulista, nascido em Americana em 1995. Formado pela Universidade de Brasília em 2019. Residência em Ginecologia e Obstetrícia no HC-FMUSP. Sucesso é o acúmulo de pequenos esforços repetidos dia a dia. Siga no Instagram: @danielgodamedway