Se você trabalha ou pretende trabalhar num PS em algum momento da sua vida, você tem que estar preparado para o tratamento de crise convulsiva. Afinal, para onde iriam os pacientes depois de um episódio que assusta tanto a eles e seus familiares? A abordagem no PS do primeiro evento epiléptico é crucial e você deve estar preparado para que ele seja feito adequadamente a fim de evitar iatrogenias (extremamente comuns, infelizmente). Se você não se sente preparado e não sabe como prosseguir, se liga nesse artigo para salvar a sua vida no plantão!
Vamos dar um exemplo: chega um paciente de 42 anos trazido por familiares, etilista pesado há 20 anos, porque ele estava em casa e subitamente apresentou episódio de perda de consciência com abalos dos quatro membros por 1 minuto, seguido por confusão e sonolência com duração de 20 minutos, recuperando o nível de consciência e voltando ao basal logo após. A última vez que ingeriu bebida alcoólica foi há um dia. Ele chegou ao PS assintomático já pedindo para ir embora. Os familiares te pressionam por uma resposta e investigação complementar!
E aí, você sabe como conduzir um caso como esse? Como fazer o tratamento de crise convulsiva? Seria Diazepam EV? VO? Preciso hidantalizar? Ou iniciar carbamazepina? E exames, qual será? TC? RM? Os dois? E o EEG, precisa ser agora? Preciso internar? Se você tem essas ou outras dúvidas sobre o tratamento de crises convulsiva no PS, segue o fio nesse artigo para saná-las agora mesmo!
Cerca de 1 a 2% dos atendimentos em PS são por crises epilépticas, sendo que, desses, cerca de ⅓ será uma primeira crise. Ou seja, é algo muito frequente no PS. E não é por menos, já que 8 a 10% da população terá uma crise ao longo da vida.
Pensando nisso, vamos revisar como você deve fazer o tratamento de crise convulsiva quando um paciente te procurar por um primeiro evento epiléptico.
A primeira pergunta que você deve fazer frente a um paciente que chega em consulta dizendo que teve uma “convulsão” é: foi crise mesmo? O principal diagnóstico diferencial é síncope. Como diferenciá-las? As síncopes têm sintomas prodrômicos característicos (fraqueza generalizada, mal estar inespecífico, sensação de desmaio, escurecimento visual e sudorese profusa) e as crises pós-ictal (período de sonolência e confusão após a crise). Então duas coisas para perguntar: pródromo e pós-ictal.
Perceba pessoal, não há “abalos” ou “liberação esfincteriana” para ajudar a diferenciar entre crise e síncope — ora, ambos podem ocorrer tanto em crise como em síncope! Mais uma informação que pode ajudar e sugere que o evento foi epiléptico é mordedura de língua, especialmente nas bordas laterais, conforme a foto a seguir.
Após definido que foi um primeiro evento epiléptico, o segundo passo é: como classificá-lo (calma, o tratamento de crises convulsivas, especialmente a primeira, depende dessa classificação! Preste bem atenção)? Aqui você quer definir se é:
Obs1: os distúrbios metabólicos devem ser considerados como causa de uma crise em até 24h da sua normalização!
Obs2: as crises provocadas são sempre generalizadas, com uma única exceção: distúrbios glicêmicos.
Na avaliação inicial há algumas informações imprescindíveis:
Se liga em como deve ser o seu algoritmo de tratamento de crises convulsiva no PS:
Não custa lembrar também sobre os parâmetros clínicos para manejo clínico inicial adequado, que também fazem parte do tratamento de crises convulsiva e que evitam complicações secundárias à crise. Se liga em como deve fazer isso:
Obviamente os exames que você vai pedir dependem de cada caso. No entanto, uma dúvida é muito frequente — quando eu posso liberar o paciente sem um exame de imagem? E não é por menos, existem muitos locais no nosso país que não têm TC prontamente disponível ou que pode demorar várias horas e grandes distâncias para conseguí-la. Então, segue a lista de quando você NÃO pode dispensar a neuroimagem:
Nesses casos, não dá para ficar sem exame de imagem de jeito nenhum! Não pode comer bola! O tratamento de crises convulsivas dependerão dos exames de imagem.
Sabendo de tudo isso, vamos direto ao ponto sobre o tratamento de crise convulsiva, baseado na classificação de uma primeira crise que demonstramos logo acima.
Uma dúvida frequente é se o paciente já teve crises previamente (ou seja, pacientes que já têm o diagnóstico de epilepsia). Como é o tratamento de crise convulsiva desses pacientes? Seguem as perguntas a serem respondidas no PS:
Temos um paciente de 42 anos com história de etilismo pesado que interrompeu o consumo de bebida alcoólica há um dia – essa informação não está aí à toa, né?! Ele apresentou uma crise generalizada. Vamos resumir o tratamento de crise convulsiva desse paciente no PS de uma forma bem prática!
O paciente em questão tem um possível fator desencadeante, né?! Ele pode ter uma abstinência alcoólica. Ora, você já sabe que crises por abstinência alcoólica são aquelas que ocorrem entre 6 e 48 da última ingestão.
Sabendo disso, vamos fazer o tratamento dessa crise convulsiva como tal. Porém, calma! Não se esqueça de uma coisa: obviamente, a primeira conduta é a estabilização clínica do paciente, como você faz em qualquer paciente potencialmente grave. Você coletará exames de sangue gerais e vai fazer uma glicemia capilar, conforme mencionamos acima. Ora, distúrbios metabólicos e glicêmicos são causa comum de eventos epilépticos e o tratamento dessas crises convulsivas é óbvio (correção desses distúrbios).
Mas e aí, se você identificar uma hipoglicemia, já vai corrigir de cara?! NÃO, galera! O paciente é etilista crônico… esses pacientes estão em risco de deficiência de tiamina. Caso você ofereça glicose sem repor os estoques de tiamina, poderá precipitar encefalopatia de Wernicke!!! Fique atento a isso! Além disso, crise pode ser manifestação de encefalopatia de Wernicke, apesar de raro.
Outro ponto importante: o paciente teve uma crise de curta duração (como a maioria das crises) e já se encontra com recuperação total do nível de consciência. Como é o tratamento da crise convulsiva, então? Você precisa administrar Diazepam EV? É claro que não, galera! Diazepam EV é abortivo de crise, ou seja, só deve ser administrado enquanto o paciente ainda estiver tendo a crise. E Fenitoína?
Pessoal, guarde essa mensagem para questões e para a vida: crise não é igual hidantalização! Não há regra aqui — avalie caso a caso para definir se precisa ou não entrar com fármaco anticrise. Esse não é um caso que precisa, já que temos um fator desencadeante bem definido e que será manejado com outras medicações (benzodiazepínico por via oral, com foco na síndrome de abstinência alcoólica) e não com fenitoína.
Então agora você não vai ter mais dúvida sobre o tratamento de crise convulsiva no PS. Espero que tenham gostado!
Com certeza você também precisará medicar seus pacientes da melhor maneira possível, então aproveita e dá uma olhada no nosso Guia de Prescrições! Com ele, você estará muito mais preparado para encarar qualquer plantão do Brasil!
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Paranaense nascido em 1990. Formado pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR) de Curitiba em 2014. Residência em Neurologia pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Palo (HCFM-USP), concluída em 2019. No HCFM-USP, experiência como preceptor dos residentes entre 2019-2020. Concluiu um fellowship em Neuroimunologia em 2021. Experiência como médico assistente do departamento de Neuropsiquiatria do Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná (HC-UFPR). "As doenças são da antiguidade e nada se altera sobre elas. Somos nós que mudamos na medida em que estudamos e aprendemos a reconhecer o que antes era imperceptível."
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