A ideia do parto dolorido, regado a gritos e sofrimento está na cabeça de todos nós quando se imagina um parto vaginal. Desde as histórias das nossas avós até as cenas de filmes constroem um medo em muitas mulheres quando imaginam passar por essa experiência. Quantas mulheres já te falaram que escolheram o parto via cesariana por medo da dor? Mas você sabia que nem sempre o parto precisa ser sinônimo de dor? Você conhece as formas de analgesia de parto e sabe que elas não se restringem a raquianestesia para cesárea? O objetivo desse texto é te levar por esse mundo mágico da analgesia de parto e te mostrar que dá, sim, para parir sem dor! O conhecimento desses conceitos é essencial mesmo para o médico generalista.
A dor leva no organismo materno a um aumento no tônus simpático, levando a aumento na ansiedade e resposta ao estresse, o que causa um aumento de catecolaminas circulantes. Essas catecolaminas circulantes podem levar a uma incoordenação uterina contrátil, redução do fluxo sanguíneo uterino e até alterações em cardiotocografia. Isso pode levar a um ciclo de aumento de dor com alterações no trabalho de parto.
A origem da dor depende de qual estágio do trabalho de parto a paciente se encontra. Na fase de dilatação, a experiência dolorosa se dá principalmente pelo estímulo de receptores nociceptivos do colo uterino, muito responsivos ao estiramento, e também pelas alterações de pressão causadas pelas contrações. Aqui a dor é difusa e pouco localizada. Já no período expulsivo, a dor já passa a ter um componente somático por tração e distensão do assoalho da pelve, levando a um quadro de dor bem localizada.
No entanto, precisamos lembrar que a experiência de dor é individual e subjetiva, muito relacionada a fatores pessoais que envolvem experiências da mulher, desejo de parto vaginal, aceitação da gestação, limiar de dor biológico, características físicas. O alívio da dor pode ser obtido por métodos diferentes para cada mulher e a conduta nunca é generalizada.
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Voltando ao nosso tema, precisamos entender que existem as formas farmacológicas e não farmacológicas de alívio da dor. Vamos iniciar pelas medidas não farmacológicas.
Mas, antes de começarmos, temos uma dica de ouro pra te dar: se você quer dominar a base da analgesia e sedação e se sentir seguro para prescrever um plano de analgesia otimizado e individualizado, sugiro fazer o nosso Curso de Analgesia e Sedação: do PS à UTI.
Agora sim, vamos ao tema:
Além disso, outros métodos não farmacológicos podem ser empregados no alívio da dor. Dentre eles podemos citar: musicoterapia, aromaterapia, hipnose, acupuntura, massagem, acupressão e estimulação elétrica transcutânea.
Pensando em métodos farmacológicos, vamos antes entender e definir a sua classificação. Analgesia é o alívio da dor gerado por meio de fármacos ou procedimentos físicos (eletroanalgesia, acupuntura), já a anestesia é a perda total da sensibilidade podendo ser local, locorregional ou geral. E falando aqui da anestesia para parto vaginal, ela é feita segundo a demanda da paciente, ou seja, não há uma dilatação mínima que indique o procedimento.
Atualmente as técnicas padrão ouro para o alívio da dor são os bloqueios regionais de condução. Estes são preferidos em relação aos anestésicos parenterais. A técnica mais utilizada é o duplo bloqueio: bloqueio combinado de raquianestesia e peridural. Inicialmente é utilizada uma dose inicial de anestésico local e/ou opióides no espaço subaracnóide, seguida de uma analgesia peridural com inserção do cateter no espaço subaracnóide. Esse cateter garante a administração complementar de medicação, essencial para um parto vaginal que pode levar várias horas.
Em relação às medicações, as mais utilizadas são a bupivacaina com vasoconstritor, adicionada de sufentanila ou fentanila, no bloqueio peridural. Já no bloqueio combinado, realiza-se uma dose de ataque de bupivacaína acrescida de sufentanila. Em ambas as técnicas, a complementação é realizada com bupivacaína e sufentanila, podendo ter alterações conforme protocolo do serviço.
Algumas situações contraindicam a realização do bloqueio regional, entre elas estão:
Outra situação importante diz respeito às pacientes com distúrbio de coagulação. Fica contraindicado o bloqueio de neuroeixo nas pacientes com:
As complicações da analgesia podem ser imediatas ou tardias. Pensando nas imediatas, temos a hipotensão materna como uma das mais notáveis. Ocorre pela vasodilatação periférica causada pela droga administrada somado à redução do estímulo doloroso.
Aqui é importante estar atento ao risco de hipoperfusão placentária e sofrimento fetal causado por essa queda pressórica – quadro bem mais comum em fetos com pouca reserva de base. Nesses casos, a alteração da cardiotocografia é transitória e responsiva às medidas de reanimação intrauterina. A realização da técnica de duplo bloqueio tem como risco ainda, a migração do cateter peridural.
Pensando em alterações tardias, temos a cefaleia pós-punção, decorrente da perda de líquor, com alterações de pressões na topografia do neuroeixo. Geralmente começa a partir do 2º dia pós punção, com piora importante na ortostase, e melhora significativa na decúbito.
Devemos sempre lembrar da monitorização fetal após analgesia de parto. Evita-se a posição supina, para descompressão da veia cava inferior. Nos casos permitidos a deambulação sob supervisão é interessante para estimular a progressão do trabalho de parto.
Nesse caso, a escolha entre a anestesia raquidiana e peridural é feita com base nas condições da paciente e no tempo de cirurgia. Atualmente a raquianestesia é a mais utilizada. Os tempos entre a incisão uterina e o nascimento devem ser os mais breves possíveis e o desvio do útero para esquerda auxilia na descompressão da veia cava inferior e melhora o retorno venoso.
Outra técnica disponível é a anestesia local, que pode ser feita por meio de bloqueio do nervo pudendo (indicada quando a apresentação está baixa e houver dilatação completa), técnica transvaginal (aqui o ponto de referência é o ligamento sacroespinhal) ou técnica transperineal (nessa técnica a agulha é direcionada para a fossa isquiorretal). Estes têm por finalidade permitir a incisão e o reparo da episiotomia quando necessário ou sutura de lacerações em casos de parto vaginal sem analgesia prévia.
Ficou claro que temos um arsenal enorme para alívio da dor no parto? Você consegue entender como são realizados e como conduzir pacientes submetidas à analgesia? Espero que após essa leitura essas perguntas tenham ficado claras para você.
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Piauiense, nascida em Bom Jesus em 1996. Formada pela Universidade Federal do Piauí (UFPI) em 2019. Residência em Obstetrícia e Ginecologia na Universidade de São Paulo - HC FMUSP SP. Quanto maior o esforço e o estudo, maior a recompensa.