Olá pessoal, tudo bem? Hoje nós vamos falar sobre um tema que deixou obstetras e gestantes de cabelo em pé há algum tempo e que até hoje inspira preocupação e cuidados específicos na gestação: a infecção por Zika Vírus durante a gravidez.
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No primeiro semestre de 2015 vivemos um surto de infecções pelo Zika Vírus no Brasil, principalmente na região Nordeste. Nessa época, muitas incertezas sobre a infecção reinavam nos plantões de pronto socorro, nas Unidades Básicas de Saúde e nos laboratórios de pesquisa.
Uma tabela comparando os sintomas de diferentes arboviroses auxiliava no diagnóstico baseado na clínica e sintomatologia dos pacientes (Dengue x Chikungunya x Zika – quem será dessa vez?). O diagnóstico laboratorial nessa época não era tão acessível ou certeiro como gostaríamos. Muitas vezes o paciente ia pra casa na incerteza: pode ser Dengue ou Zika ou só um resfriado mesmo. “Toma esse paracetamol que estou receitando e se não melhorar você retorna em três dias”.
Isso porque logo compreendemos que se tratava de uma infecção com pouco potencial de gravidade para adultos. Tínhamos em geral sintomas autolimitados. Por isso, fazer o diagnóstico de forma super precisa não era necessário caso o paciente estivesse bem. Ufa! Era uma infecção leve na maioria das vezes.
Mas, alguns meses depois, passou a circular a notícia mais grave relacionada ao surto de 2015. A infecção por Zika vírus durante a gravidez podia levar a anormalidades estruturais graves no sistema nervoso do feto. O termo microcefalia, desconhecido para a maioria das pessoas até então, passou a circular e a causar pânico entre as mulheres grávidas.
A recomendação oficial era de adiar as gestações programadas e de monitorar as gestantes infectadas. Isso tudo veio junto a muitas dúvidas. Mas uma certeza tínhamos: o Zika vírus era sim teratogênico.
Aos poucos o número de infecções foi caindo e o medo foi diminuindo. Passado o surto, ficou a conclusão de que a transmissão vertical do Zika vírus é uma realidade.
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Voltando ao nosso tema, o ZIKA é um arbovírus pertencente ao gênero Flavivirus da família Flaviviridae, transmitido principalmente por artrópodes infectados, dentre eles o Aedes aegypti (o mais comum no Brasil). É transmitido também por via sexual e transplacentária.
Foi identificado inicialmente em macacos Rhesus, em 1947, na África (na floresta chamada Zika, em Uganda). O primeiro caso em humanos ocorreu na Nigéria em 1954, e após essa data o número de infecções apresentou um crescimento lento até as primeiras epidemias em Ilhas do pacífico, em 2007.
O vírus chegou ao Brasil em 2015, e, até esse momento, sofreu muitas mutações, recombinações genômicas e formação de mais de uma linhagem: a asiática e a africana. Isso alterou o potencial patogênico do vírus e ampliou sua capacidade de danificar o sistema nervoso central de fetos humanos.
O principal meio de transmissão do Zika vírus é a picada do mosquito Aedes aegypti infectado. E falando em vírus transmitidos por Aedes aegypti, o Brasil vive há muitas décadas uma situação sanitária bastante complexa.
Sofremos com surtos repetidos de arboviroses e uma dificuldade bastante importante de controle do vetor, que é a única forma realmente efetiva de controle destas doenças.
Nós sabemos muito bem que temos que esvaziar os pratinhos, virar as garrafas e não deixar água acumulada nos pneus. Mas até hoje essas medidas não conseguem controlar a proliferação do mosquito em nenhuma região do Brasil. Dengue, febre amarela, Zika e Chikungunya continuam a nos assombrar.
Assim, o vírus recém chegado ao Brasil, encontrou a situação ideal para a replicação. Um vetor que circulava muito e que driblava todas as tentativas de controle realizadas até aquele momento. Tudo isso tornou a epidemia ainda mais grave no Brasil.
A infecção pelo Zika vírus é descrita como uma doença aguda febril e autolimitada. A maior parte das infecções é assintomática e até 25% dos infectados apresentam sintomas leves e inespecíficos.
Em casos de infecções sintomáticas, os sintomas surgem de 3 a 14 dias após o contato, e tendem a durar de 3 a 7 dias. Felizmente, poucos casos vão evoluir com complicações graves. As complicações mais frequentes são desidratação extrema, acometimento articular, encefalite e a síndrome de Guillain-Barré.
Os sintomas mais frequentes são:
Ou seja, os sintomas podem ser bastante inespecíficos e se confundir com várias outras doenças e infecções. E pensar nos diagnósticos diferenciais neste momento é muito importante, sobretudo para pacientes gestantes. Zika, Chikungunya, dengue, toxoplasmose, sarampo, rubéola, citomegalovírus, herpes e sífilis são as possibilidades.
O diagnóstico correto aqui é muito importante, já que algumas dessas doenças têm tratamento específico na gestação com o objetivo de reduzir as taxas de infecção vertical.
Quanto ao Zika Vírus, não há tratamento específico para a infecção. Mas as gestantes com diagnóstico confirmado devem ser encaminhadas a serviço de medicina fetal sempre que possível para correta condução, tratamento e monitoramento fetal.
Ah… não podemos esquecer de notificar! A notificação de casos suspeitos de Zika no Brasil é obrigatória. E nas gestantes a recomendação é notificar qualquer caso de doença exantemática, suspeita ou confirmada.
As infecções por Zika vírus na gravidez não têm maior potencial de gravidade, mas sabemos que o vírus circula nas gestantes por um intervalo de tempo maior. Isso provavelmente se relaciona à replicação placentária do vírus.
Se existe suspeita de Zika em gestante o diagnóstico laboratorial deve ser realizado para proporcionar correta condução do caso. Pode ser realizado PCR para detecção do RNA viral em amostra de sangue ou soro até sete dias após o início dos sintomas. Após esse período pode ser realizado exame sorológico para Zika e para Dengue (principal diagnóstico diferencial). É importante ressaltar que podem acontecer resultados errados graças às reações cruzadas com outros vírus da família Flavivírus.
É muito difícil estimar as taxas de infecção vertical e acometimento fetal pelo Zika vírus, já que grande parte dos casos não terá diagnóstico preciso. Mas sabemos que a infecção por este vírus pode levar a abortamento, óbito fetal, alterações oculares, restrição de crescimento intrauterino e malformações neurológicas, dentre elas a temida microcefalia. O Zika vírus tem tropismo pelo sistema nervoso central e pode interromper o crescimento, a proliferação e a diferenciação de células neuronais.
As infecções que ocorrem no primeiro e no segundo trimestre da gestação, em geral, levam a sequelas mais graves no desenvolvimento neurológico do feto. Temos maior probabilidade de evoluir com ventriculomegalia, calcificações intracranianas e microcefalia. As infecções que ocorrem no terceiro trimestre podem levar a alterações mais leves, detectadas mais tardiamente, inclusive após o nascimento: anormalidades oculares, déficits auditivos, disfagia, convulsões e microcefalia.
A microcefalia pode ser diagnosticada através de ultrassonografia durante a gestação ou após o parto. Para o diagnóstico durante a gestação é fundamental uma datação adequada da gravidez, já que os parâmetros de normalidade das curvas de avaliação da circunferência cefálica dependem da idade gestacional.
Outros sinais ultrassonográficos podem levar à suspeita de Zika na gestação: dilatação dos ventrículos cerebrais, calcificações parenquimatosas, periventriculares ou no núcleo da base, porencefalia, alargamento do espaço subaracnoide e artrogripose. Muitos desses sinais podem ser confundidos com outras infecções verticais como toxoplasmose e rubéola.
Nos casos suspeitos por infecção materna comprovada ou por alterações ultrassonográficas sugestivas, pode ser realizado PCR do líquido amniótico obtido através de amniocentese. Não existe tratamento específico para a microcefalia, mas o suporte adequado à família, nesses casos, é fundamental. Esse suporte envolve cuidados multidisciplinares, inclusive apoio psicológico.
Nos casos de infecção por Zika Vírus, com ou sem acometimento fetal associado, a via de parto e o momento de resolução da gestação não precisam ser modificados. A indicação da melhor via de parto é obstétrica. A amamentação não está contra indicada e em geral é possível mesmo em casos de alterações neurológicas do recém nascido.
O conceito mais importante em relação à infecção por Zika vírus na gestação é a prevenção. Ou seja: o ideal é evitar que esta mulher adquira a infecção durante o período gestacional. Já falamos que a melhor alternativa é combater o mosquito Aedes aegypti impedindo a sua reprodução e proliferação. Mas sabemos que essa medida não consegue ainda controlar totalmente as arboviroses.
Por isso, toda gestante deve tomar uma série de cuidados e medidas para sua proteção individual, evitando a exposição ao mosquito Aedes aegypti e a infecção pelo Zika Vírus:
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Aquele abraço, pessoal! E até a próxima.
Nascido em 1993, em Maringá, se formou em Medicina pela UEM (Universidade Estadual de Maringá). Residência em Medicina de Emergência pelo Hospital Israelita Albert Einstein.